Febre do ‘morango do amor’ impulsiona produção, vendas e criatividade em Campo Mourão e região
Ele está em alta; não apenas o famoso “morango do amor”, mas também a procura pela fruta que dá nome e é o ingrediente principal do doce. De sul a norte do Brasil, das menores às maiores cidades, desde as mais pequenas confeiteiras até as grandes docerias, a casquinha crocante com recheio cremoso e morango fresco se tornou “viral” – não só nas redes sociais – desde, pelo menos, o início deste mês de julho.
Em Campo Mourão, o impacto da nova sensação já é percebido em diversos setores. Apesar dos preços da fruta praticamente não terem sofrido alterações nos campos da região, especialmente entre os produtores e vendedores locais – com valores que variam de R$ 25,00 a R$ 30,00 o quilo – o mesmo não se pode dizer dos supermercados e hortifrutis, onde bandejas de 250 gramas que antes eram vistas a menos de R$ 10,00 já ultrapassam R$ 19,00 (isso quando tem). O preço por quilo chega a aproximadamente R$ 45,00.

A valorização da iguaria vem acompanhada por uma explosão nas vendas e por uma demanda crescente, que tem desafiado produtores, comerciantes e confeiteiros. A produção local, por exemplo, já não consegue suprir o consumo atual.
De acordo com dados da Secretaria Estadual da Agricultura e do Abastecimento (Seab), repassados à TRIBUNA pelo agente técnico do Departamento de Economia Rural (Deral) em Campo Mourão, Paulo Borges, no ano passado, foram registrados 16 hectares de plantio de morango em estufas e a céu aberto na Comunidade dos Municípios da Região de Campo Mourão (Comcam), que abrange 25 municípios da região.
Essa área total resultou em uma produção de aproximadamente 243 toneladas de morango. Somente em Campo Mourão, a produção em uma área de 1 hectare teve rendimento estimado em cerca de 10 toneladas, conforme detalhou Borges. Segundo ele, o fechamento dos dados referentes à produção deste 2025 será realizado apenas no ano que vem.

Com mais de três décadas de experiência no cultivo da fruta, a produtora Maria Lúcia dos Santos Baretta define o momento como inédito. “Está uma loucura, todo mundo querendo”, relatou. Ela contou que passou a atender três vezes por semana – em vez da tradicional sexta-feira – e, ainda assim, há fila de espera. “Tem pessoas que estão vindo de fora buscar da região aqui, Araruna, Luiziana, vários lugares”, revelou.
Segundo Maria Lúcia, nem em datas comemorativas como Dia dos Namorados ou Natal viu algo semelhante. “A gente só tinha uma procura dessa que seria assim todo Dia dos Namorados, no Dia dos Pais. Mas assim não, nunca tinha visto não”, falou surpresa. A correria é tanta que, mesmo com a fruta fora do ponto ideal de maturação, os clientes aceitam o que tem. “Hoje mesmo [quarta-feira (30)] foi um morango um pouco mais verde, mas vai do jeito que está”, disse.
Apesar da alta demanda, ela manteve os preços. Como trabalha com tamanhos diferentes, os morangos grandes custam R$ 30,00 e os menores R$ 25,00 o quilo. “Eu não alterei o valor”, informou, ao dizer que, seu público-alvo, que era mais voltado a supermercados, agora, abrange todo tipo de clientes, inclusive o consumidor final, que tem procurado diretamente sua propriedade com frequência.

Para Telma Rita Uhren, que produz morangos há 10 anos no município de Roncador, a realidade não está diferente nas últimas semanas. A procura está tão alta, que, mesmo com 9 mil pés da fruta em sua propriedade, não está dando conta de suprir nem a demanda no município. Muitas pessoas acabam insistindo para Telma fornecer o que tiver.
Porém, ela explicou que o cultivo da fruta não é como o preparo de uma massa, que pode ser feito a qualquer momento. O morango depende de fatores como o clima, o tempo de maturação e outras variáveis. Além disso, ela não utiliza agrotóxicos, apenas produtos biológicos, o que também pode prolongar o tempo de cultivo. “Às vezes, as pessoas não entendem, porque muitos que usam agrotóxicos produzem o dobro que a gente”, comentou.
Já o clima é outro fator determinante para o tempo de produção da fruta. “No verão, é incrível, você chega na plantação de manhã e colhe o morango, se chegar à tarde, tem morango novamente para colher. No inverno, ele chega a demorar quinze dias para madurar totalmente”, explicou, acrescentando que em dias frios e nublados, o tempo pode chegar a até 25 dias para a fruta ser colhida.
Apesar da alta procura, inclusive de novos consumidores finais que passaram a procurá-la diretamente, ela mantém os pés no chão, consciente de que essa onda pode ser passageira. Segundo explicou, atende a todos que consegue, mas dá prioridade aos clientes de longa data, especialmente aos estabelecimentos comerciais que já são seus fregueses. “Eu não posso deixar os meus fregueses na mão, porque, e depois, o que eu vou fazer com os meus morangos?”, refletiu, ao acrescentar que o preço do produto também permanece inalterado: há cerca de três anos, o quilo do morango é vendido por R$ 30,00.
A busca crescente também é percebida nas ruas. Samuel Pereira e sua esposa, Laise, comercializam morangos em Campo Mourão tanto no atacado quanto no varejo. Mesmo com a alta demanda, eles mantiveram o preço que já vinham praticando: a bandeja de 700 gramas segue sendo vendida por R$ 25,00.
Apesar disso, segundo Pereira, os pedidos dispararam nas últimas semanas. “Poderíamos comparar esse final de mês com uma véspera de Natal ou Páscoa”, afirmou, surpreso, o vendedor. “70% dos novos clientes são para morango do amor”, contou impressionado. Outro vendedor local, Rui, compartilhou avaliação semelhante. Conforme disse, a procura cresceu bastante, mas o preço repassado ao consumidor final também foi mantido.

Produção do doce
Para quem transforma o morango em doce, a situação é ainda mais intensa. A confeiteira Carolina Laurani Molina Vian disse estar produzindo, em média, 100 unidades por dia. Mesmo assim, não dá conta da procura. “A demanda diária nunca supre, o que você fizer vende”, comentou.
Mãe de duas crianças pequenas, ela adaptou a produção para três vezes por semana, pois garantir a matéria-prima tem sido um desafio. “Morango, difícil de achar, os corantes já esgotaram, tem que comprar fora”, relatou. “Quase que não consegue fazer todo dia”, disse.
Carolina vende cada unidade por R$ 13,00, valor que considera justo, mesmo diante da alta dos insumos. “Tem que se virar nos trinta, se não não atende os pedidos não. Uma loucura”, declarou. Em Campo Mourão, os preços do morango do amor têm variado, em média, entre R$ 10,00 e R$ 20,00 a unidade, embora também seja possível encontrá-los por valores menores ou mais elevados.
Apesar da maratona, a confeiteira disse estar satisfeita com o retorno, pois a “moda” veio em boa hora para quem atua no ramo. Ela ficou receosa de iniciar a produção do doce, porque, além de ser um trabalho a mais, precisa conciliar com outros produtos que oferece. Mas, como estava recebendo muitos pedidos, “se rendeu”, começou a confecção na semana passada e não se arrepende. “Muito sucesso. Como diz o outro, não tem pra quem quer”, expressou, com alegria. Nesse movimento, há, ainda, quem se arrisque a fazer o doce em casa, apenas para consumo próprio.

Para muitas doceiras, a iguaria não é novidade. A confeiteira Elaine Amaral dos Santos, por exemplo, já produzia o doce desde o ano passado, mas só recentemente percebeu a explosão da procura. Hoje, ela também faz cerca de 100 unidades por dia, a R$ 10,00 cada, mas afirmou que “a quantidade não supre a demanda”. Em sua produção, o tradicional morango do amor ganhou até variações, como com brigadeiro de maracujá.
Nas vitrines da doceria de Simone Kehl, que possui duas unidades em Campo Mourão, o cenário também é de sucesso absoluto. A produção, que começou em junho, logo viralizou e passou a vender de 350 a 400 unidades diárias nas últimas semanas, esgotando antes do final do dia. “O ponto mais positivo deste doce foi ver o trabalho artesanal das confeitarias sendo valorizado”, reconheceu. Lá, além da versão tradicional por R$ 17,00, também são oferecidas outras variações criativas, como maracujá, uva e até com leite ninho e Nutella.

A sensação do momento também abriu espaço para a criatividade de quem não trabalha diretamente com confeitaria. É o caso de Bruna Grotti Ribeiro, proprietária de uma padaria artesanal. Embora não produza o doce clássico, ela aproveitou a onda para lançar o “croissant do amor”.
“A ideia de participar dessa febre também foi para aproveitar um alimento que está no auge, numa roupagem diferente, que está tirando o sono dos clientes”, explicou. A massa amanteigada do tradicional croissant ganhou uma cobertura especial de caramelo, unindo o conceito da tendência à identidade da marca.
“A gente pegou o conceito pra deixar um produto que a gente tem ainda mais gostoso”, destacou. A empreendedora comemorou as possibilidades de um produto em alta que, com criatividade, pode ser reinventado de diversas formas. “Como produtora de alimentos, eu acho muito bacana como você pode criar em cima de ingredientes”, avaliou.
Seja no campo, na cozinha ou nas ruas, o morango do amor tem movimentado a economia local, como também vem mostrando a força das redes sociais para impulsionar tendências. “Foi um final de mês surpreendente”, frisou o vendedor Samuel. Para muitos produtores e confeiteiros, o que parecia ser apenas uma moda passageira está rendendo mais do que curtidas: está garantindo renda, visibilidade e criatividade.

