Venezuelana retoma trajetória na Educação e recomeça a vida com a família em Campo Mourão
Com uma história marcada por desafios, resistência e recomeços, Dayry Arminda Urdaneta Morán, de 44 anos, encontrou no município de Campo Mourão uma oportunidade de refazer a vida com dignidade. Há cerca de seis anos e oito meses, ela decidiu sair de seu país de origem, a Venezuela, junto com o marido e três filhos, para morar no Brasil.
Antes residente na cidade de Maracaibo, no estado de Zulia, a presença de parentes em Campo Mourão facilitou a instalação da família no município. Ao longo dos anos, o casal e os filhos fixaram residência e fizeram da cidade o seu novo lar, onde pretendem continuar residindo.
Em entrevista à TRIBUNA, Dayry contou sua história e os desafios de adaptação em um país anteriormente desconhecido. Ela comentou o motivo de ter emigrado da Venezuela. “Saí do meu país de origem por causa de problemas políticos, fome, insegurança e dificuldades econômicas. Vim para Campo Mourão em busca de uma vida melhor e de mais oportunidades para recomeçar”, resumiu.
A Venezuela enfrenta forte concentração de poder político, crise econômica e dificuldades sociais, em meio a tensões internacionais e desafios humanitários que se arrastam há anos. Isso faz com que muitos moradores busquem refúgio em outros países, como é o caso do Brasil.
A migrante descreveu que a vida no município paranaense está “bem melhor”. Ela relatou que no Brasil há mais segurança, acesso à alimentação, além de estar conseguindo se adaptar à nova rotina em Campo Mourão. Parte da família ainda permanece no país vizinho. “Ainda sinto falta do meu país, mas estou grata pelas oportunidades que hoje tenho aqui”, afirmou.

Nova graduação em Pedagogia no Brasil
Dayry, que já é graduada em Educação Integral na Venezuela, equivalente ao curso de Pedagogia no Brasil, resolveu continuar na área da Educação em seu novo país. Prestes a entrar na reta final da graduação, ela está no terceiro ano do curso, no período diurno, na Universidade Estadual do Paraná (Unespar), campus de Campo Mourão.
“Tenho interesse em entender as metodologias, o sistema educacional e as práticas pedagógicas brasileiras, para poder continuar atuando na minha profissão e me adaptar melhor ao contexto daqui”, explicou. A estudante comentou que há algumas semelhanças na educação de ambas as nações, como ser obrigatória e gratuita, porém também existem diferenças significativas.
Entre as principais distinções destacadas por ela, estão a formação e a atuação do profissional pedagogo. No Brasil, a graduação prepara o pedagogo para atuar da educação infantil ao ensino fundamental, incluindo outras habilitações. Já na Venezuela, a formação é segmentada: cada etapa da educação exige uma habilitação específica.
Dayry exemplificou com a sua própria formação. “Por exemplo, eu sou graduada em licenciatura de educação integral, que seria o [ensino] fundamental, de primeiro até sexto ano”, disse. Ela destacou, ainda, que essa é mais uma diferença em relação ao Brasil, onde, há alguns anos, o 5º ano passou a ser considerado o final da primeira etapa do ensino fundamental.
A moradora de Campo Mourão relatou que, embora a educação venezuelana seja gratuita e obrigatória, o setor também sofre dificuldades no país. Conforme comentou, as condições que a Venezuela enfrenta há anos também acabam fragilizando a educação. Segundo Dayry, por exemplo, faltam materiais escolares básicos, professores e outros recursos.

Adaptações, desafios e expectativas
Apesar de viver com a família no Brasil há quase sete anos, Dayry considera que o processo de adaptação no novo país ainda está em andamento. No entanto, logo no que chegaram, foi ainda mais desafiador, especialmente em relação ao idioma, já que em seu país de origem a língua oficial é o espanhol. “Eu acho que a gramática aqui é muito maior”, observou.
Por isso, a migrante falou que uma das primeiras providências quando chegou foi ir em busca de um curso de língua portuguesa. Toda a família fez uma formação gratuita no Colégio Estadual Oswaldo Cruz. Além disso, a cultura e os costumes locais de Campo Mourão também causaram estranhamento. “Mesmo assim, aos poucos, estou me adaptando e construindo uma nova vida aqui”, enfatizou, comentando que também teve dificuldade de encontrar trabalho no início.
Mas o acolhimento que o casal e os filhos vêm recebendo na cidade foi apresentado por ela como um motivador para a adaptação. Segundo ela, a maioria das pessoas são respeitosas e acolhedoras com sua família. Isso não significa que não aconteçam eventuais casos de preconceito, seja pelo sotaque ou pela nacionalidade. A forma como procuram lidar com essas situações, no entanto, é com paciência e mostrando que vieram para contribuir e construir uma vida melhor no Brasil.
Para o futuro, Dayry não espera nada extraordinário, após as dificuldades que já enfrentou. Ela deseja continuar estudando, melhorar seu português e conseguir uma boa oportunidade de trabalho na área da Educação. “Quero poder exercer minha profissão aqui no Brasil, contribuir com meus conhecimentos e oferecer uma vida melhor para minha família. Também espero seguir aprendendo e crescendo pessoal e profissionalmente”, disse, com humildade.

Família
Não é apenas a Dayry que está se preparando para conseguir melhores oportunidades de trabalho e condições de vida em Campo Mourão. O esposo, Carlos, que atualmente atua como motorista de aplicativo, também está cursando uma faculdade. Ele está no primeiro ano da graduação em Matemática, na Unespar.
Já a filha mais velha, Catery, de 24 anos, é graduanda de Nutrição na Unicesumar. Danyela, de 22, está seguindo os passos da mãe e iniciou este ano a graduação de Pedagogia, também na Unespar. Por sua vez, o filho mais novo, Adán, de 19, está em fase de prestar vestibular, com o objetivo de fazer Administração.
Dayry não trabalha formalmente, mas participa de projetos universitários, como voltados à Pedagogia Hospitalar, e de iniciativas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID). Além disso, oferece aulas particulares de espanhol, de forma independente.
Migrantes em Campo Mourão
De acordo com a Cáritas Diocesana de Campo Mourão, atualmente, há centenas de migrantes e refugiados de diversos países no município, incluindo pessoas oriundas, além da Venezuela, da Argentina, de Cuba, da Colômbia, do Marrocos, do Egito e da Tunísia, por exemplo. Atualmente, mais de 1.200 pessoas de diferentes nacionalidades vivem no município. Só nos últimos meses, 258 novos migrantes foram acolhidos.
A Cáritas foi fundada em 2021 em Campo Mourão. Por isso, quando Dayry, o esposo e os três filhos vieram para cá, esse suporte institucional ainda não existia. “Naquele momento, recebi ajuda da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias e da ONU, que me apoiaram bastante”, contou, ao reconhecer a importância da Cáritas nos últimos anos.

