Indígenas de Campo Mourão conquistam certidões de nascimento após anos de espera

Um marco histórico foi registrado na aldeia Verá Tupã’i, na comunidade Barreiro das Frutas, em Campo Mourão. Após anos de tentativas frustradas, sete indígenas enfim receberam nessa quarta-feira (12) suas certidões de nascimento civil — documento essencial para o exercício pleno da cidadania. A entrega foi realizada pelo Cartório de Registro Civil de Campo Mourão, em parceria com o projeto “Aldeia Viva”, do Centro Universitário Integrado, dentro do programa nacional “Registre-se!”, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Entre os beneficiados está seo Antônio Tupã Jemugarai Acosta, de 64 anos, e seus filhos — alguns na fase adulta, outros concluindo o ensino médio. Todos possuíam apenas o registro indígena emitido pela Funai, documento que já foi aceito anos atrás, mas que atualmente não é reconhecido para fins civis.

Sem a certidão de nascimento civil, a família enfrentava dificuldades básicas para matrícula escolar regular, acesso a serviços de saúde, emissão de RG, CPF ou título de eleitor, participação no serviço militar, entre outros. “Estávamos atrás deste registro há mais de cinco anos. Agora poderemos acessar serviços que não conseguíamos antes”, comemorou Antônio Tupã.

Seu filho, Gabriel Mbaraka Miri Acosta, de 19 anos, que concluiu o ensino médio recentemente, também comemorou a emissão do documento. “Até que enfim. Sem documento, estava muito difícil. Agora posso procurar oportunidades”, comentou.

A professora e presidente da associação indígena, Nilza Maria Rodrigues (Jaxy Rndy), lembrou da dificuldade enfrentada pela comunidade desde 2016: “Os meninos estudavam sem documentos”

A professora e presidente da associação indígena, Nilza Maria Rodrigues (nome indígena Jaxy Rndy), lembrou da dificuldade enfrentada pela comunidade desde 2016. “Os meninos estudavam sem documentos, e isso trouxe problemas psicológicos. Sem identidade, não se sabe quem se é no mundo não indígena. A Funai não nos orientou, não ajudou, não fez a parceria com os cartórios. Tivemos que ler a Constituição e ir atrás sozinhos”, desabafou.

O cacique da aldeia, Guilherme Kunumi Poty Acosta, também comentou sobre as dificuldades com a falta do documento e da longa espera para finalmente a emissão da certidão. “Esperamos seis anos. Para a Funai é complicado. Graças ao Integrado e ao cartório, conseguimos. Estamos muito felizes. Agora todos têm documentação”, afirmou.

O cacique da aldeia, Guilherme Kunumi Poty Acosta, é um dos beneficiados: “Agora temos documentação”, comemorou

Parcerias que transformam vidas

A ação só se concretizou graças ao alinhamento entre o Cartório de Registro Civil e o projeto “Aldeia Viva”. A oficial substituta do cartório, Lilian Rosana Goldoni Takeda, explicou a importância da iniciativa. “A comunidade tinha apenas o registro indígena, mas não o civil, que é o documento base de qualquer cidadão. Muitas coisas — escola, saúde, benefícios — só são possíveis com a certidão. É emocionante trazer cidadania aqui na aldeia”, comentou.

A analista de extensão do Centro Universitário Integrado, Tayane Jamyle Patrício, que participou da entrega dos documentos, reforçou que a parceria existe desde 2022.

“Fazemos atendimentos odontológicos, buscamos e levamos os indígenas até o campus, e agora ampliamos com outros cursos: Agronomia, Enfermagem, Farmácia, Direito. É uma via de mão dupla: os alunos aprendem com a aldeia e também aplicam na prática o que aprendem”, argumentou.

“Estávamos atrás deste registro há mais de cinco anos. Agora poderemos acessar serviços que não conseguíamos antes”, falou seo Antônio Tupã

A entrega das certidões integra o programa “Registre-se!”, criado pelo CNJ para combater o sub-registro civil e ampliado em 2025 com o Provimento nº 199, tornando a política permanente. O programa agora funciona durante todo o ano, com foco em indígenas, quilombolas, ribeirinhos, migrantes, pessoas em situação de rua e privadas de liberdade.

No Paraná, segundo Lilian, o sub-registro é baixo, mas ainda existem famílias vulneráveis. “O primeiro registro e a primeira via da certidão são gratuitos. Muita gente não sabe desse direito”, reforça.

Paralelamente, o projeto de extensão Aldeia Viva atua desde 2022 levando saúde, educação, tecnologia e cidadania à comunidade Verá Tupã’i. A diretora de graduação do Integrado, Mariana Pavanelli, destacou o impacto social gerado pela iniciativa. “É muito gratificante. As crianças já produzem desenhos sobre higiene bucal, participam de oficinas e atividades. A iniciativa transforma e conscientiza. Aprendemos muito com eles.”

O projeto conta com cerca de 20 voluntários e apoio do Rotary Club Campo Mourão Lago Azul e do Rotary Club Gralha Azul. “Nos sentimos orgulhosos de fazer parte dessa transformação”, afirmaram Lilian e Mariana.

Parceria entre Cartório de Registro Civil e o Projeto Aldeia Viva, do Integrado, fez a entrega de sete certidões de nascimento aos indígenas da aldeia, no Barreiro das frutas. Na imagem, os beneficiados e participantes do projeto

Receberam o registro civil

Antonio Tupã Jemugarai Acosta
Marcos Jeroky Poty Acosta
Guilherme Kunumi Poty Acosta
Marcelo Acosta
Juliano Rey Vy Ju Acosta
Gabriel Mbaraka Miri Acosta
Lucas Tupã Acosta