Aos 100 anos, Leony deixou um histórico e forte legado educacional

Campo Mourão, 15 de fevereiro de 1950. Numa minúscula sala, anexa à antiga prefeitura ainda de madeira, em frente à Praça Getúlio Vargas, a guarapuavana Leony Prado Andrade dava a sua primeira aula. Minutos antes, num gesto carinhoso, dez crianças haviam ido até a casa dela, buscá-la. Ela ainda não sabia, mas aquele seria o primeiro dia de uma missão educacional histórica na cidade. E que transformaria a sua vida, por décadas. Uma das responsáveis por moldar a educação mourãoense, Leony completa hoje (30/07) 100 anos de idade.

A história dela começa em 30 de julho de 1925, dia em que nasceu em Guarapuava. Nascida em um berço de muitos recursos, ainda “mocinha”, foi à Curitiba estudar na Escola de Professores (Instituto de Educação) perto da Praça Zacarias. Então, em 1943, concluiu o ginasial no Colégio Nossa Senhora de Lourdes, onde muitas meninas mourãoenses também foram estudantes internas.

Sua forte base educacional não foi construída ao acaso. Ela teve mestres como Erasmo Pilotto, ex-secretário de Estado da Educação, além da poetisa Helena Kolody. “Fui pensionista interna do Colégio São José, na Praça Rui Barbosa. Em 1945 me formei professora, apta a lecionar”, disse ela. Agora formada, retornou à Guarapuava. E, sozinha, conseguiu sua nomeação pelo Estado, contra a vontade de seu pai, que não queria que ela trabalhasse.

Além de ter sido diretora da Escola Marechal Rondon, Leony também participou da criação da Escola Normal Regional Emiliano Perneta e da Escola de Formação de Professores João d’Oliveira Gomes. Foi a primeira mulher a receber o título de Cidadania Honorária de Campo Mourão, em 1984

Leony chegou a Campo Mourão em 1950, a contragosto. Seu pai, que conheceu a região em 1922, encantou-se com os “Campos do Mourão” e decidiu trazer a filha recém-casada – se casou com o médico Manoel Andrade – para morar na cidade. A mudança marcou o início de uma longa trajetória como educadora.

Destemida e com forte personalidade, em 1952 participou da inauguração do Grupo Escolar de Campo Mourão, embrião do atual Colégio Marechal Rondon. Anos depois, em 1957, foi a responsável por sugerir o nome da escola em homenagem ao sertanista Cândido Rondon — proposta aceita pelo Estado. Acompanhar a construção da sede definitiva, onde está até hoje, junto ao mestre de obras Basílio Ochrim, foi um dos marcos de sua carreira.

A educadora assumiu oficialmente a direção do colégio em 30 de novembro de 1955 e permaneceu ali até 1985, quando se aposentou após 30 anos de gestão. Ainda assim, continuou atuando como auxiliar educacional. “Cumpri minha missão com amor à educação e a Campo Mourão”, afirmou em uma de suas últimas entrevistas.

Dona Leony e o esposo Manoel Andrade

Legado

Além de ter sido diretora da Escola Marechal Rondon, Leony também participou da criação da Escola Normal Regional Emiliano Perneta e da Escola de Formação de Professores João d’Oliveira Gomes. Foi a primeira mulher a receber o título de Cidadania Honorária de Campo Mourão, em 1984.

Recentemente, Leony doou centenas de fotografias, documentos e objetos pessoais ao Museu Municipal Deolindo Mendes Pereira. Parte significativa do material pertencia a seu irmão, Nelson Bittencourt Prado, advogado e jornalista, que manteve em 1951 o jornal Correio de Campo Mourão.

E não bastasse todo o seu legado, aos 100 anos, completados hoje, continua ensinando as próprias cuidadoras: Diomar à esquerda e Solange, à direita

Ela se casou em 1950 com o doutor Manoel Andrade (o “Cely”, como era carinhosamente chamado). Leony é mãe de Joana d’Arc e avó de Carolina e Victor, que nasceram nos Estados Unidos. Na residência onde acompanha o progresso da cidade que ajudou a construir, Leony mantém viva a memória de um tempo em que ser professora era sinônimo de liderança comunitária. Seu legado resiste não apenas na lembrança dos ex-alunos, mas nos alicerces de uma das instituições de ensino mais respeitadas da cidade.

Mesmo chegando a Campo Mourão sem assim desejar, passou a testemunhar um amor incondicional à cidade. Tanto é que jamais a deixou. Hoje, aos 100 anos, Leony mantém uma rotina que reforça seu amor pela educação. Sob os cuidados das cuidadoras Solange Silva e Diomar Santos, leva uma vida regrada: dieta naturalista sem açúcar e com pouco sal, exercícios cognitivos diários e aulas informais de geografia, história e português para as próprias funcionárias. Cantar o Hino Nacional, o Hino de Campo Mourão e marchinhas antigas continua sendo um de seus maiores prazeres.