José Mário teve fé. E foi salvo

Foram 43 dias hospitalizado. Trinta, somente na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Vítima da Covid-19, José Mário Leal de Moraes não se lembra de quase nada. Em uma das camas da Santa Casa, estava vulnerável. Entre a vida e a morte, a fé ditou o próprio destino. E, com a sabedoria de médicos e enfermeiros, foi salvo. Ele é tão somente mais um de tantos reféns da doença. Muitos, não voltam. No seu caso, o retorno à vida foi como um milagre divino. 

Bioquímico renomado e dono de um laboratório em Campo Mourão, José Mário, 52, fez testes para a Covid em mais de mil pessoas na cidade. Sempre se protegeu de todas as formas possíveis. Mas o vírus é traiçoeiro e perigoso. No dia 25 de janeiro, numa segunda feira, ele soube que receberia a tão sonhada vacina. Mas antes, decidiu realizar o teste em toda sua equipe do laboratório. Pronto. Ele e uma funcionária testaram positivo.

Já completamente isolado, no sábado, dia 30, teve uma breve falta de ar. Então buscou a Santa Casa. Nos primeiros dias, continuava bem. Mesmo a falta de ar, não era tão grave. No dia 04 de fevereiro, após se levantar para tomar banho, sentiu verdadeiramente uma fraqueza nos pulmões. Era a deixa às más notícias. Após exames, constatou-se infecção severa nos dois órgãos. Não existia outra alternativa. José Mário começava a subir as rampas para o andar de cima: a temida UTI Covid.   

Na luta pela vida, foi intubado. Os dias se alternavam entre boas e más notícias. Comum ao cenário da doença. Médicos são unânimes em afirmar que o vírus atua de formas diferentes, como um estrategista. Enquanto sedado, aqui fora, orações e angústia pela família. Uma dor infinita. Não haviam certezas, de nada. Apenas, esperanças, de tudo.

Com o corpo entregue aos médicos e enfermeiros, José Mário lutou bravamente. E ele estava em boas mãos. Através de pequenos canos – equipos de soro -, drogas eram injetadas aos montes. Oxigênio, sedativos, anti inflamatórios, mais drogas. Quase tudo ligado às veias. O paciente da Covid, se assemelha a uma espécie de robô. É uma parafernalha de tubos, equipamentos, medicamentos. Uma verdadeira guerra ante a um inimigo. Mas uma guerra sem armas de fogo. Nas batalhas do dia a dia, o maior escudo chama-se paciência. E a guerra é lenta. Muito lenta. 

Boas notícias. No dia 24 de fevereiro, José Mário é extubado. E foi traqueostomizado. Aos poucos foi deixando a sedação. O quadro começava a melhorar. No dia seguinte, acordou. “Quando acordei, me perguntaram se eu sabia onde estava. Disse que não. Me explicaram que estava no hospital. Que a cidade havia decretado lockdown. Que a UTI estava lotada. Mas, pra mim, ainda era dia 6 de fevereiro. Não lembrava de nada”, disse. 

No dia 27, os aparelhos começaram a ser retirados. Dias depois já saía da UTI e, finalmente, teve alta hospitalar, definitiva, em 14 de março. Deixou a ala numa cadeira de rodas. Estava fraco, como ele mesmo disse, “no pó da gaita”. E foi recebido por familiares ao som de um violão. Música para a alma. Eram as boas vindas de volta à vida. “Quero deixar claro o meu agradecimento aos profissionais da Santa Casa. Aos idealizadores do hospital. Nota 10 ao atendimento. Graças a Deus não me transferiram. Aqui a equipe médica é muito competente. Tinham aparelhos e equipe profissional de enfermeiros. Não me faltou nada. Estou vivo”, afirmou.

José Mário disse que se recorda dos dias antecedentes à UTI. “Como sou da área da saúde, acompanhei os exames, ainda na enfermaria. E via que eu estava piorando. Eu também sabia que tinha uma família aqui fora. Por eles, minha fé foi muito forte”, revelou. Para ele, durante a internação, um filme passou pela cabeça. Como o dia em que se casou. O nascimento das duas filhas. Lembranças do falecido pai. “Até coisas de criança, que você não lembrava, começam a aparecer”, disse. 

Já em casa, com a respiração ainda debilitada e fraqueza motora, José Mário faz um apelo à população. De acordo com ele, o vírus está em todos os lugares. “Temos que manter o distanciamento. Evitar festas e aglomerações. Usar máscaras. Lavar as mãos a todo instante. Utilizar álcool em gel. É uma conscientização coletiva. Se não nos cuidarmos, todo mundo vai pegar”, destacou. Até pouco tempo, ele teria a sorte em sair vivo. Mas agora, teve sorte redobrada em poder receber atendimento. “O que as pessoas têm que saber agora, é que nem todos conseguirão uma vaga no hospital”, disse.