Nair Silva: 45 anos de dedicação entre as memórias do cemitério de Campo Mourão

Entre túmulos, flores e lembranças, há quase meio século uma mulher escreve silenciosamente parte da história do cemitério de Campo Mourão. Aos 80 anos, Nair da Rocha da Silva, conhecida carinhosamente como dona Nair, é uma verdadeira pioneira na limpeza e conservação de túmulos no “campo santo”, um ofício que se transformou em missão de vida.

“Acho que já tem uns 45 anos por aí que entrei trabalhar aqui”, diz ela, ao relembrar o início de sua trajetória na limpeza dos túmulos. Segundo dona Nair, o trabalho começou ao lado do marido, que também trabalhava no local. “Quando eu entrei trabalhar aqui, meu marido trabalhava aqui também. Daí fui pegando serviço, pegando serviço e estou aqui até hoje”, conta.

Ao longo dessas mais de quatro décadas, foi dali, entre as cruzes e os caminhos de terra, que dona Nair vem sustentando a família. Com o que ganha na limpeza, conseguiu realizar até mesmo o grande sonho da casa própria. “Quando nós entramos aqui, nós não tínhamos quase nada. Foi com o dinheiro daqui que construí minha casa”, diz, ao comentar que a renda do serviço é a única que entra na casa.

Mas a rotina, marcada por esforço, também tem enfrentado dificuldades. “De uns tempos pra cá, nós estamos sofrendo muito. Alguns pedaços têm mato, eles (a prefeitura) deveriam carpir com a enxada porque a grama tem que cortar, né?”, diz se referindo à limpeza dos espaços comuns. “Nós gastamos bastante aqui. Nós compramos buchas, sabão para fazer os serviços e acaba perdendo tudo”, lamenta.

Apesar das histórias e lendas que envolvem os cemitérios, Dona Nair garante que nunca teve medo e jamais presenciou algo de incomum no cemitério

Apesar das histórias e lendas que envolvem os cemitérios, dona Nair garante que nunca teve medo e jamais presenciou algo de incomum no local. “Nunca vi nada. Trabalho sozinha e nunca vi nada”, afirma.

Mesmo com 80 anos, dona Nair segue firme no ofício, com o mesmo capricho e dedicação de quando começou. O tempo parece não ter apagado sua disposição, nem o amor pelo que faz. “Eu gosto de estar aqui. Sinto uma paz”, diz.

Entre as mãos calejadas de dona Nair, a memória de centenas de famílias se mantém viva. Cada túmulo limpo, cada flor colocada com cuidado, carrega um gesto silencioso de respeito e carinho. E assim, há 45 anos, ela transforma o cemitério em um lugar não apenas de despedidas, mas de vida, gratidão e história.

Números
O Cemitério Municipal de Campo Mourão foi criado em 1947, é o principal da cidade e concentra mais de 15 mil sepultamentos.

O município possui dois cemitérios (um central e um novo, em área de expansão urbana).

Estima-se que cerca de 8 a 10 mil pessoas visitem o cemitério no Dia de Finados, gerando demanda extra por serviços de limpeza e ornamentação.

Informalidade
O serviço de limpeza, pintura e conservação de túmulos é realizado, em sua maioria, por trabalhadores informais, que sobrevivem exclusivamente dessa renda.

Na cidade, o preço médio cobrado por uma limpeza completa varia entre R$ 30 e R$ 80, dependendo do tamanho do túmulo e da data (no feriado de Finados, a procura triplica).

Trabalhadores costumam fornecer os próprios materiais — baldes, buchas, sabão, panos e água.

Em Campo Mourão, há registro de pelo menos 10 pessoas que atuam de forma fixa na limpeza de túmulos, especialmente em datas comemorativas.