A camisa azul e a tirania

“Ao tomar uma decisão de menor importância, eu descobri que é sempre vantajoso considerar todos os prós e contras. Em assuntos vitais, no entanto, tais como a escolha de um companheiro ou profissão, a decisão deve vir do inconsciente, de algum lugar dentro de nós. Nas decisões importantes da vida pessoal, devemos ser governados, penso eu, pelas profundas necessidades íntimas da nossa natureza”. Sigmund Freud

Nossa vida é uma sequência interminável de decisões. Conforme avança, nosso acervo de deliberações só aumenta. A cada dia, são milhares de alternativas e opções, às quais optamos em fazer ou não.

Quando abro o guarda-roupas pela manhã, enfrento uma das mais difíceis alternativas do dia: Escolher a cor da camisa. E, por mais que, ao comprá-las, já tenha feito uma seleção, ainda assim as opções dentro do guarda-roupas consomem algum tempo toda manhã.

Nesse exemplo, ao escolher a camisa azul, deixo de lado todas as outras cores e modelos. Sem ressentimentos, sem ódio, sem culpa. Apenas ficam pra outro dia. Trata-se da simples preferência do dia. 

Embora seja uma reflexão e uma decisão, a escolha da cor da camisa passa longe de qualquer avaliação moral ou ética. Assim como escolher um prato no almoço, tomar um sorvete ou decidir o melhor caminho para o trabalho. 

São decisões de cunho estritamente pessoal. E, ao sê-lo, não afetam outras pessoas. No máximo causam um momento de maior ou menor satisfação a quem escolheu. 

Mas quem dera fossem essas as decisões a serem tomadas o tempo todo. Conforme crescem em complexidade, passam a ter influência para o próximo, e então, serão consideradas de implicância moral. 

Ao levar uma fechada no trânsito, decido se dou uma buzinada, devolvo a fechada, parto para a agressão ao motorista imprudente, ao apenas me resigno e sigo o caminho. O caráter de minha formação moral me guiará à melhor decisão no momento.

Assim como, ao receber uma proposta suspeita, a decisão tomada me garanta que qualquer outra seria inaceitável, e que esta é moralmente superior à outra. É o que acontece quando decidimos não roubar, não matar, ou não mentir. 

Enquanto nos primeiros exemplos as decisões são meramente preferências pessoais, onde não podemos esperar que outros tomem a mesmas decisão – imaginem todos de camisas azuis – as questões morais presentes em situações de convivência implicam na expectativa de que qualquer outra pessoa, nas mesmas condições, faça a mesma escolha.

Para quem decide, há uma certeza subconsciente de que alguém que tome uma decisão diferente será inaceitável, porque essa escolha é superior, em valor, daquela outra. 

Hoje, com a superexposição de opiniões, os valores morais também ficam mais explícitos, saindo do ambiente mais restrito e presencial para o nível cibernético das redes. Não há, no entanto, como exigir que todos devam agir segundo os mesmos referenciais de comportamento e valores. Assim como não dá pra exigir um mesmo padrão estético ou de gostos. 

Exigir e querer impor seu modo de pensar, seus valores e suas preferências não se trata de decisão moral. Trata-se de tirania. 

Carlos Alberto Facco – Secretário de Desenvolvimento Econômico de Campo Mourão | [email protected]