Nós não precisamos de outro herói

“Basta um dia para se tornar um super-herói, mas é necessário uma vida inteira para se fazer um homem de bem.” Paul Brulart

1985. Nas telas dos cinemas, estreiava o terceiro filme da série Mad Max, Além da Cúpula do Trovão. 

Além de atuar no filme, Tina Turner, a cantora e compositora suíça (nasceu americana mas renunciou à cidadania), apresenta a principal trilha, “We Don't Need Another Hero”. 

O momento atual que vivemos me fez lembrar desta música, pois uma caracteristica do povo brasileiro é de buscar heróis em tempos de crise. 

Na última semana, vimos líderes políticos (a começar pelo Presidente da República) bancando de heróis ao apresentar soluções mágicas para a cura ou prevenção ao Covid 19. 

Não não precisamos de outro heróis, diz Tina. “e eu me pergunto quando vamos mudar isso. Vivendo sob o medo até que nada mais permaneça. Nós não precisamos de outro herói. Não precisamos saber o caminha de casa. Tudo o que queremos é vida além da Cúpula do Trovão” (seria hoje além da pandemia?). 

Fico perplexo com a atuação de algumas lideranças políticas brasileiras. Admiro sua capacidade de encontrar soluções fáceis e imediatas de defendê-las com uma coragem de herói. Fazendo crer os mais desinformados que agora sim, sairemos desta crise, graças ao prefeito que distribui kit Covid, algumas vezes superfaturado. 

Quando da época desta música, 1985, com meus 18 anos, eu percebia a que a instituição Presidência da República tinha uma aura de importância e respeito, afinal, era o representante do país, tanto internamente como no exterior.

Hoje vejo uma pessoa usando um linguajar chulo e até desrespeitoso, gravando um vídeo de camiseta tomando  cloroquina como se fosse o mais especialista dos médicos, induzindo milhões de pessoas a acreditarem que a maior pandemia que se tem notícia no mundo é apenas uma invenção de cientistas esquerdistas que querem criticá-lo. 

“E eu me pergunto”, segue Tina, “quando vamos mudar isso?” Nós somos a última geração, aquela que herdou o que nos foi deixado, quando vamos assumir o nosso papel de protagonistas? 

É comum em tempos de crise, quando a sociedade sente-se ameaçada, que as pessoas fiquem aflitas e busquem a presença de um herói, para livrá-las das dificuldades. 

Surgem então personagens que, a partir de manipulações conscientes, entendem os sinais e os códigos da ansiedade das pessoas, e passam a encenar um papel esperado. O papel do herói. 

O herói identifica então as ideologias, as identidades, a expectativas da sociedade e forma sua imagem a partir destes elementos. 

Nesse momento de uma crise avassaladora, tenho medo do perigo de aparecerem no horizonte heróis de plantão com soluções mirabolantes, como salvadores da pátria. Porque sei que muitas pessoas tem exatamente essa esperança. 

Mas tenho convicção de que somos ainda milhões que preferimos a sensatez, a pesquisa, o diálogo, a busca por soluções realistas, não fantasiosas. Que iremos assumir que não precisamos de novos heróis, magos nem redentores, e sim de maturidade, trabalho, cooperação, e fé. 

Carlos Alberto Facco – Secretário de Desenvolvimento Econômico de Campo Mourão | [email protected]