Burocracia: vilã ou guardiã?
“Mais do que processos e formulários, a burocracia funciona como um mecanismo de justiça e controle social.”
Você já precisou de um serviço público ou vender para uma instituição pública e achou que eram exigidos muitos processos, formulários e detalhes para a conclusão? Pois é, isso se chama burocracia. Mas será que burocracia é algo ruim? Ou pode ser também um instrumento de segurança para a sociedade?
A chamada Teoria da Burocracia, desenvolvida por Max Weber no início do século XX, buscava compreender como organizações poderiam ser mais racionais, previsíveis e eficientes. Para Weber (1947), a burocracia não era apenas “papelada”, mas sim um sistema de regras, normas e procedimentos padronizados, que evita decisões arbitrárias e garante a impessoalidade na administração. Em outras palavras, trata-se de um modelo organizacional que limita o poder individual em benefício do interesse coletivo.
Autores posteriores, como Robert Merton (1957), analisaram os efeitos negativos da burocracia, como a rigidez excessiva. No entanto, mesmo nessas críticas há o reconhecimento de que a padronização funciona como uma proteção contra abusos pessoais dentro das organizações. Já Michel Crozier (1964) demonstrou que, embora a burocracia possa gerar disfunções, também cria zonas de previsibilidade que reduzem o risco de favorecimentos.
Em outras palavras, pode-se afirmar que a burocracia, ao estabelecer regras e controles claros, atua como um mecanismo que evita desvios de finalidade no uso de recursos públicos e pode reduzir significativamente as possibilidades de corrupção.
Do ponto de vista da governança, a OCDE (2020) destaca que sistemas burocráticos bem estruturados, com regras claras de contratação e fiscalização, estão diretamente associados à redução da corrupção e aumento da transparência. A multiplicidade de controles e a exigência de documentação não são meros entraves: funcionam como barreiras contra a apropriação privada de recursos públicos.
Na vida do cidadão, isso significa que, embora o processo seja por vezes demorado e cansativo, é justamente ele que garante que a vaga em um concurso público não seja decidida por apadrinhamento, que a compra de medicamentos seja feita de forma transparente, e que empresas concorram em pé de igualdade em licitações. A burocracia, portanto, é um instrumento de justiça social e um mecanismo protetivo.
É claro que há espaço para modernizar processos e reduzir excessos, principalmente com a transformação digital. No entanto, é um equívoco associar a burocracia apenas à lentidão e ineficiência. Como demonstram as teorias clássicas e os estudos recentes, a burocracia é também um antídoto contra a corrupção e um pilar da confiança institucional.
Assim, minha opinião é clara: se por um lado precisamos avançar na desburocratização inteligente, por outro não podemos abrir mão da burocracia como estrutura de poder legítimo, controle social e segurança para a população. Afinal, como indicam as evidências científicas, o que protege o cidadão não é a ausência de regras, mas a sua correta aplicação.
Rosinaldo Nunes Cardoso é Administrador, Especialista em Gestão de Pessoas e Estratégias Competitivas, Mestre em Administração com foco em Empreendedorismo, Inovação e Mercado, e Diretor de Pesquisa e Gestão do IPPLAN – Instituto de Pesquisa e Planejamento de Campo Mourão.

