Estamos sendo justos com a publicidade?

Talvez você não goste do que vai ler aqui. Na verdade, talvez nem eu goste, mas aprendi que o primeiro passo para resolver um problema é admitir que você tem um. O ponto é que tenho visto tantas marcas no tribunal da inquisição moral da sociedade ultimamente, que achei melhor conversarmos um pouco mais sobre isso.

Tudo começou no início da pandemia, quando várias marcas foram criticadas por fazerem doações gigantescas para ajudar a mitigar os impactos da Covid-19 no país. Sim! Marcas criticadas por ajudar. As acusações são de que as marcas andam fazendo esse tipo de “atrocidade” de ajudar o próximo, justamente para querer aparecer. Mas ora ora ora, que petulância! Onde já se viu uma marca querendo aparecer? E eu que achei dentro da minha inocência que elas, as marcas, existiam para isso.

Mas ok, o ponto aqui talvez nem seja esse, mas sim, que a publicidade está tentando ser justa com o mundo, mas será que o mundo está tentando ser justo com a publicidade? Se uma marca faz, é aproveitadora. Se não faz, é descompromissada socialmente. Se faz, mas esquece algum tipo de minoria, é excludente. 

Calma! Antes que você retire algum trecho desse artigo e transforme em uma grande chamada de fake news, ou que você queira me cancelar como andam cancelando tantas marcas por aí, é importante deixar claro: eu não estou aqui defendendo que as marcas não cumpram o seu papel social, ou que não devemos estar atentos às mudanças do mundo. A publicidade tem, e sempre terá, um papel social importante, principalmente, em um país tão desigual e carente de cultura como o nosso. O que eu simplesmente trago são algumas tristes verdades. Parem de achar que os publicitários irão salvar o mundo. Essa responsabilidade não é nossa, pelo menos não sozinhos. Não espere que as marcas substituam políticos e políticas públicas de educação e cultura. Não espere que as marcas façam o que você (sim, você mesmo) poderia estar fazendo enquanto as critica. 

Não adianta reclamar que não viu nenhum negro no comercial do banco, mas não se importar quando falam sobre diversidade na sua empresa. Não adianta reclamar quando o governo censura comerciais com gays, mas fazer piada quando seu primo decide te contar que também é. Estamos pressionando tanto as empresas para que tenham propósitos, que muitas passaram a adotar propósitos falsos, marqueteiros, apenas para silenciar uma parcela da população, sem entregar nada de benefício real à sociedade. Apenas frases bonitas nas entradas de seus prédios agora tão inúteis quanto os próprios propósitos em si.

Se o seu sabonete não está fazendo uma campanha social para salvar o mundo, aceite que talvez ele só queira ser um sabonete mesmo.

Desculpe a sinceridade por aqui, mas a mudança do mundo não está na publicidade. Ela é só um reflexo do que nós somos como sociedade. É como diria Gabriel o Pensador: “Muda que quando a gente muda, o mundo muda com a gente, a gente muda o mundo na mudança da mente, e quando a mente muda a gente anda pra frente”. Se você está triste com a propaganda, você deveria estar triste conosco. Porque nós somos a mudança, não as marcas.

André Lima, é paulista, do interior de São Paulo, e escolheu o interior gaúcho para viver e empreender desde os 19 anos. Publicitário, cofundador e diretor de criação da agência Batuca, é viciado em metáforas com futebol e apaixonado por pão com manteiga na chapa.