Após enchente que prejudicou produção de água em Campo Mourão, especialista alerta para manejo de solos

Recentemente, com o excesso das chuvas, a Sanepar (Companhia de Saneamento do Paraná) precisou interromper, de forma temporária, a produção de água em Campo Mourão. A medida foi adotada devido ao acúmulo de grande volume de sedimentos nas bombas que fazem a sucção do Rio do Campo, que abastece o município. Isso impediu o transporte da água até a estação de tratamento.

Esses materiais sedimentares podem ser terras levadas por erosões causadas em lavouras com a grande quantidade pluviométrica, materiais soltos em vias públicas, como areia de construção, por exemplo, que vão parar em galerias pluviais e desembocam em rios, ocupações, entre outros. A TRIBUNA ouviu o professor, engenheiro civil e ambiental e coordenador do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) José Eudes José Arantes, que fez apontamentos sobre o problema. De antemão, ele alertou sobre a importância do manejo correto de solos para prevenir esse tipo de ocorrência.

Além disso, segundo o especialista, toda ocupação acaba gerando impactos. Por isso, muitas vezes, dependendo das técnicas utilizadas para manejo de solo, estradas rurais e, até mesmo, proteção às áreas de preservação que ficam nas margens dos rios são questões que podem influenciar a ocorrência desses problemas, ressaltou.

Arantes tem propriedade para falar do assunto. Já desenvolveu e orientou vários trabalhos nesse segmento. O professor alertou que são diversos os fatores que contribuem para o aumento de transporte de sedimentos nas bacias hidrográficas e o consequente acúmulo deles nas barragens. “Quando não se utilizam técnicas adequadas de retenção da água no solo, acaba impermeabilizando o solo, em alguns casos, e aumentando a velocidade da água. Essa maior velocidade acaba carregando mais sedimentos”, esclareceu.

Com isso, nos locais de captação de água, como as barragens, os sedimentos trazidos ao longo das bacias hidrográficas ficam represados. “Os sedimentos mais finos, que a gente chama de argila, às vezes, nem se depositam nesses pontos, passam reto”, comentou, complementando que, conforme essas partículas vão passando pelas barragens, a água vai ficando com uma turbidez alta. Por isso a água fica coloração ‘amarronzada’, em função do rastro deixado pela argila.

Nas áreas urbanas, esses fatores estão relacionados à drenagem das águas, das ruas, que também carregam sedimentos. “Normalmente, também tem bastante resíduos sólidos que vão para os rios. Isso ocorre principalmente nas áreas urbanas”, elucidou. Além disso, ressaltou a importância de se ter um tratamento adequado nos esgotos sanitários.

Complementou, ainda, que as áreas rurais não estão isentas de poluentes. Pelo contrário. Nesse caso, o acúmulo de sedimentos é gerado sobretudo pelo excesso de nutrientes que é depositado nos solos. Com altos volumes de chuva, eles acabam sendo carregados para os rios. Isso pode causar o excesso de nitrogênio e fósforo, por exemplo. ‘Maiores impactos ambientais’ podem ser gerados com o uso de defensivos agrícolas.

Para além disso, há a influência da formação do solo de cada região. Arantes explicou, por exemplo, que Campo Mourão tem uma alta concentração de argila. “A região aqui já faz um tempo que sofre com esse processo”, disse.

Todas essas condições influenciam na qualidade da água. “Aí tem os processos de tratamento. A própria Sanepar tem as estações de tratamento, e os órgãos devem fazer a fiscalização para manter o rio dentro dos limites”, enfatizou, lembrando-se das resoluções e órgãos responsáveis por fazer essa regulamentação, como o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente).

Trabalhos em curso

O professor revelou que está orientando o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de um aluno para buscar identificar locais de origem dos sedimentos na bacia. Isso é importante, pois o abastecimento de água em Campo Mourão vem sendo comprometido.

Ele destacou que já desenvolveu e vem orientando também alguns projetos para determinar as causas das vazões do Rio do Campo, no caso de eventos extremos. “Vai ter outro TCC que vai defender essa semana sobre as vazões máximas da bacia”, exemplificou, mostrando outro estudo que tem sido desenvolvido.

Currículo

Eudes Arantes possui graduação em Engenharia Civil pela Universidade de São Paulo (2000), mestrado (2003) e doutorado (2007) em Engenharia Hidráulica e Saneamento pela Universidade de São Paulo pela Universidade de São Paulo.

Tem experiência na área de Engenharia Civil e Ambiental, com ênfase em Hidráulica e Saneamento, atuando principalmente nos seguintes temas: fluidodinâmica computacional, vertedouros em degraus, hidráulica, hidrodinâmica de reatores para tratamento de efluentes, planejamento de recursos hídricos, águas subterrâneas, interação rio e aquífero.

Atualmente é professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e chefe do departamento acadêmico de Engenharia Ambiental e Sanitária. Também é membro representante no Conselho Municipal do Meio Ambiente de Campo Mourão.

O professor já desenvolveu e orientou diversos projetos na área da biologia, transporte de sedimentos, qualidade da água da bacia do Rio do Campo e do Rio Mourão. Atualmente, continua desenvolvendo alguns projetos de extensão e orientando TCCs e iniciação científica. Além disso, é professor de mestrado na área de gestão e regulação de recursos hídricos.