Dia do Trabalho marca conquistas e expõe desafios ainda enfrentados pelos trabalhadores

Neste 1º de Maio, Dia do Trabalhador, além da celebração das conquistas históricas da classe trabalhadora, ganha destaque uma pauta que tomou os debates sociais recentemente e continua à tona: a escala 6 por 1. Adotado em grande parte dos setores produtivos e de serviços no Brasil e no exterior – especialmente aqueles que operam todos os dias da semana, como comércio, indústria, saúde e segurança –, esse regime de trabalho prevê seis dias consecutivos de atividades com apenas um de descanso, realidade que levanta preocupações quanto à saúde física, mental e à qualidade de vida dos profissionais.

Para tratar sobre esse e outros assuntos relacionados ao direito dos trabalhadores, a TRIBUNA conversou com a advogada Renata Moysa, que atua há mais de 12 anos no Direito Trabalhista e Previdenciário em Campo Mourão. Pós-graduada pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), Renata também integra o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher e acompanha de perto as transformações e tensões vividas pelos trabalhadores mourãoenses, muitas das quais refletem a realidade nacional.

Conhecendo a realidade de muitos trabalhadores com os quais já atuou, a advogada se posiciona de forma contrária ao atual modelo 6×1. “Eu sou contra a escala seis por um. Um dia só de descanso é muito pouco”, defendeu, ao comentar que essa escala sobrecarrega os trabalhadores, sobretudo quem é mãe, que quase não tem tempo para os filhos.

Além disso, para ela, também impacta negativamente os próprios empregadores, porque essas pessoas acabam não permanecendo por muito tempo nos empregos. Renata apontou que a rotatividade é grande justamente nas áreas que aplicam essa escala. “Quando encontram algo melhor, os trabalhadores saem. Isso prejudica também o empregador, que perde mão de obra treinada”, afirmou.

A discussão sobre esse modelo se intensificou no Brasil após a apresentação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 8/25) pela deputada federal Erika Hilton (PSOL, de São Paulo), que sugere a substituição da jornada 6×1 por uma escala 4×3 – quatro dias de trabalho e três de descanso, sem redução salarial. A justificativa é que essa mudança poderia melhorar a saúde do trabalhador e até estimular a economia. A PEC sugere que a redução da carga de trabalho poderia gerar 6 milhões de postos de emprego.

Estudos internacionais, como um projeto-piloto conduzido no Reino Unido com cerca de 60 empresas, apontam que a adoção da jornada reduzida levou à diminuição do estresse e do burnout, ao mesmo tempo que empresas registraram aumento de produtividade e redução da rotatividade.

A proposta ainda aguarda análise pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Embora enfrente resistência de setores empresariais, tem ganhado apoio nas redes sociais e entre parlamentares. Se admitida, seguirá para uma comissão especial antes de ser submetida à votação em dois turnos pelo Plenário da Câmara. A aprovação de uma mudança na Constituição exige apoio de pelo menos 308 deputados em dois turnos, antes de seguir para análise no Senado.

Renata destacou que, embora atualmente seja legal, o regime requer atenção às regras previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e em convenções coletivas das categorias. “É essencial garantir os intervalos e compensações previstos na legislação”, alertou.

“Já conquistamos muita coisa, mas ainda tem muito a ser conquistado”, afirmou Renata Moysa, advogada trabalhista de Campo Mourão, em entrevista à TRIBUNA

Desafios

A realidade do trabalhador em Campo Mourão reflete os desafios enfrentados em todo o país: alta informalidade, desigualdade de gênero e os impactos persistentes da Reforma Trabalhista de 2017, para citar alguns.

Por isso, para Renata, o 1º de Maio não é só uma data de celebração, mas também de alerta. “O Dia do Trabalhador é igual ao Dia da Mulher: todo dia tinha que ser lembrado, respeitado. Já conquistamos muita coisa, mas ainda tem muito a ser conquistado”, sinalizou.

Ela lembrou que casos análogos à escravidão ainda existem no país, mesmo em 2025, e que os trabalhadores precisam estar atentos aos seus direitos, especialmente os mais jovens e os que ingressam no mercado em áreas que exigem jornadas extensas ou regimes pouco regulamentados e, inclusive, quem atua de maneira informal.

A advogada comentou que a informalidade é um traço forte em Campo Mourão – e muitas vezes não é uma escolha, mas o que restou para muitos após a pandemia de Covid-19. “Aqui em Campo Mourão, tem muita gente na informalidade, sem registro, até porque muitas pessoas também não conseguem pagar os encargos de registro”, afirmou.

Essa é uma realidade que extrapola fronteiras no país. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil fechou 2024 com 39 milhões de trabalhadores informais. No Paraná, a taxa de informalidade chegou a 30,4%, conforme divulgado pela Agência Estadual de Notícias.

Diaristas, cuidadores, jardineiros e outros trabalhadores sem vínculo formal compõem essa massa “invisível” que, sem garantias, enfrenta mais riscos. Para esse público, a advogada recomenda que busque alternativas para garantir, ao menos, a cobertura previdenciária, para se ter uma proteção mínima. “Dá para pagar o INSS como contribuinte facultativo. A pessoa pode comprar o carnê em papelaria ou emitir a guia pelo site do INSS. Se tiver dúvida, é só procurar o atendimento do próprio INSS”, orientou.

Outro ponto destacado pela especialista é a desigualdade de gênero, que segue presente na sociedade como um todo. “Há muitas empresas que têm homens e mulheres no mesmo cargo, mas as mulheres não recebem igual aos homens”, ressaltou ela, que acompanha a questão também pelo Conselho da Mulher, para além da sua atuação na advocacia.

Dados do Ministério do Trabalho e Emprego indicam que a diferença salarial entre homens e mulheres no país ultrapassa 20% em muitas funções – mesmo com a nova Lei da Igualdade Salarial (Lei nº 14.611/2023), ainda em fase de adaptação nas empresas. A nova legislação exige que empresas com mais de 100 funcionários publiquem relatórios semestrais de transparência salarial, mas a adaptação ainda caminha a passos lentos.

Reforma Trabalhista

A Reforma Trabalhista, aprovada em 2017 sob a justificativa de modernizar e flexibilizar as relações de trabalho, é vista com ressalvas por profissionais da área do Direito como Renata. “A Reforma beneficiou os patrões. Retirou direitos como as ‘horas in itinere’ – o tempo de deslocamento que antes contava como hora de trabalho. Agora, não conta mais”, falou, ao acrescentar que muitos deixaram de buscar a Justiça com medo de perder e ter que pagar honorários.

Ela afirmou que a queda no número de ações trabalhistas é visível no dia a dia de seus atendimentos. Antes, os trabalhadores tinham acesso mais simples à Justiça gratuita. Agora, se perderem a ação e não comprovarem insuficiência de recursos, podem ser condenados a pagar os custos do processo.

Diante desse cenário, a advogada ressaltou que o Dia do Trabalhador é, acima de tudo, uma oportunidade de refletir sobre os rumos que o mundo do trabalho está tomando. A jornada digna, a formalização, a igualdade de direitos e a valorização humana no ambiente laboral continuam sendo, para ela, pautas urgentes e necessárias.

A data

O Dia do Trabalho, celebrado em 1º de maio nacionalmente, é uma data de grande importância no Brasil, marcada por sua origem nas lutas dos trabalhadores por melhores condições laborais. A data remonta a 1886, quando trabalhadores nos Estados Unidos protestaram por melhores jornadas de trabalho, e, anos depois, passou a ser comemorada internacionalmente.

No Brasil, o 1º de maio foi instituído como feriado nacional em 1925, refletindo a crescente mobilização sindical e a busca por direitos trabalhistas. Ao longo das décadas, a data se tornou um símbolo das conquistas dos trabalhadores, mas também um momento de reflexão sobre os desafios persistentes no mercado de trabalho.