Elvira agora mora numa casa de verdade

Na casa 410, da rua Vereador José Dutra de Almeida Lira, em Campo Mourão, tudo está diferente. Saiu o lixo do quintal, entrou um gramado novo. Também não está mais a tapera de madeira e, muito menos, um fogão à lenha, improvisado com tijolos. A casa agora mantém um fogão a gás. A residência ganhou pintura interna e externa. Piso no banheiro. Lâmpadas e portas. Sim, as portas que dona Elvira, a proprietária de 81 anos, não tinha. Ela está muito feliz. Era o maior sonho terreno: dizer que residia num verdadeiro lar.

A história de dona Elvira foi contada neste jornal há duas semanas. Ela foi identificada pelos freis franciscanos da Fraternidade O Caminho, após o filho, Adilson, pedir ajuda. Em situação de rua, ele pediu aos religiosos que a ajudassem. Queria ter melhorias no imóvel. Então, após a publicação do enredo, a população fez a sua parte.

Pessoas levaram de tudo. Lâmpadas – a casa só tinha uma -, chuveiro – não havia -, azulejos ao banheiro e à sala – estão sendo colocados -, sofá, geladeira, armários à cozinha, pratos, copos, talheres, roupas de uso pessoal e de cama. Elvira recebeu um guarda roupas, uma máquina de lavar, raque e até uma tv. E mais que tudo isso: recebeu solidariedade.

Tudo começou há uma semana, quando voluntários se somaram aos freis e, juntos, colocaram a mão na massa. A prefeitura colaborou cedendo um caminhão que recolheu todo o lixo e entulhos do quintal. Uma equipe da saúde também compareceu e levou Elvira a exames de saúde. Por uma semana, enquanto ficou hospitalizada, voluntários fizeram a sua parte. Uma cidadã cedeu e instalou a porta. Enquanto outros colocaram vidros e arrumaram encanamentos e fiações.

Antes em situação de rua, principalmente, devido às drogas e ao álcool, o filho Adilson, 45, se solidarizou ao movimento e ajudou nos trabalhos. Nas duas últimas semanas não bebeu e nem fez uso dos entorpecentes. Saiu da rua e está morando junto à ex-companheira. Ela o aceitou depois que ele deixou o “inferno”. Nos próximos dias deverá seguir o tratamento de recuperação com os freis.

Todo o trabalho foi realizado ao bem da idosa. Viúva e cega de um olho, ela era uma espécie de refém dos filhos, doentes pelo vício. Enquanto um trazia amigos para usar drogas na tapera do quintal, outro despejava sacos de lixo para selecionar recicláveis. Sempre drogados, o bem estar da mãe era esquecido. E foi assim que a casa acabou sem portas, com muito lixo e sem nenhuma espécie de amor.

O imóvel nem é tão antigo. Foi entregue à Elvira no ano de 2006, época em que foi retirada da antiga favela São Francisco de Assis. Segundo ela, uma mudança boa, quando deixaram a tapera de madeira. Mas, mesmo com a casa em alvenaria, as coisas continuaram no improviso. Tudo ali era caótico.

Dona Elvira está com 81 anos. Diz ter nascido numa tal de “Ribeira”, local que nem se lembra mais onde fica. Cresceu em meio a uma família bastante pobre, oriunda da agricultura. Trabalhou desde menina cortando cana, plantando e colhendo algodão e café. Casou aos 16. E com o passar dos anos, se tornou diarista. Quis o destino que o companheiro morresse.

Tempos depois se amigou. Agora com um homem 25 anos mais novo. Novamente, quis o destino que ela continuasse só. Ele morreu este ano, na própria casa. Dormiu e não acordou. “Tive 12 filhos. Quatro já morreram por causa do álcool”, disse. Hoje, Elvira Cordeiro de Jesus Pinheiro mora apenas com Adriano. Adilson, o outro filho, até pouco tempo também residia ali. Mas o vício pelo álcool e as drogas acabou o levando às ruas. Agora, a ficha parece ter caído e voltou a morar com a ex-companheira.

A renda da família é pequena. Elvira recebe pouco mais de R$1000 ao mês, através de uma pensão adquirida em função de um problema nos olhos. O dinheiro é usado para alimentação, contas de água e luz. Não sobra nada.

Dona Elvira não sabe ler. Muito menos escrever. Frequentou pouco a escola. Mas aprendeu muitas outras coisas na popular faculdade da vida. Vaidosa, estava com os cabelos presos. Unhas pintadas. Trata-se de uma senhora extremamente gentil. Meiga. Agora, com a casa completamente modificada, a esperança em dias melhores a contagiou. Por último, pede a quem puder um último desejo: alimentos para colocar na nova prateleira ganha, na cozinha. Em tempo: Adilson precisa da doação de argamassa e rejunte para concluir o piso da casa.