Estudante com autismo comemora 1º lugar em vestibular em Campo Mourão: ‘Me sinto mais capaz”

A estudante Anna Caroliny Claudino, 17 anos, portadora de Transtorno do Espectro Autista (TEA), venceu todas as barreiras sendo aprovada em primeiro lugar para o curso de Administração da Universidade Estadual do Paraná (Unespar) em Campo Mourão. Está concluindo o ‘terceirão’ do Ensino Médio no Colégio Cívico Militar Marechal Rondon. A jovem é dona de um riquíssimo vocabulário. Domina como ninguém, em sua idade, as palavras. Ela revelou que seu sonho, na verdade, é cursar Artes, mas como não tem esta opção no município, afirmou acreditar que Administração seria sua melhor escolha.

Carol, como é carinhosamente chamada, conquistou a classificação geral de 8,2 no vestibular. O resultado foi divulgado no dia 22 deste mês. Ela alcançou o topo da lista entre outros 176 concorrentes inscritos. E nem se dedicou exclusivamente nos estudos para o concurso. “Sinceramente não esperava ir tão bem, mas consegui este resultado. Me sinto mais capaz agora sabendo que consegui isso. Fiquei com tanto medo naquela dia porque não era nada do que eu já tinha feito antes. Era tão diferente. Foi uma experiência marcante”, falou ao se referir ao dia da prova. A estudante disse estar ansiosa para o início das aulas em 2024. “Espero ir bem no curso”, complementou.

Anna Caroliny foi diagnosticada com TEA em 2018. Tinha 12 anos na época. Uma psicóloga do colégio onde estuda foi quem percebeu e avisou a mãe. Após levá-la ao médico o diagnóstico se confirmou. A estudante disse que no início ficou assustada, mas percebeu depois que isso não a tornaria menos capaz que outras pessoas. Hoje, diz ela, a principal barreira ainda é enfrentar o preconceito e a exclusão social. “Infelizmente muita gente faz piadinhas. Muitas pessoas da sociedade usam termos pejorativos em relação a comunidade autista. Eu fico muito mal por isso”, lamentou a pequena guerreira, ao afirmar que apesar das dificuldades do dia a dia tem apoio incondicional da mãe, amigos e familiares, o que a faz ‘continuar firme na luta’. “Aos poucos estamos sendo mais reconhecidos com as pessoas ficando mais cientes da nossa existência”, observou.

A futura administradora, ressaltou a paixão por artes e animação. Ela disse que adora trabalhar com papel. Se sente realizada dando forma ao que vem em sua mente. A estudante cria de tudo. Deixa a imaginação voar. Ir além. Pudera, ela revelou à TRIBUNA que uma de suas inspirações, quando está com caderno e caneta em mãos, é ninguém mais, ninguém menos que Satoshi Tajiri, designer de jogos eletrônicos mais conhecido como criador de Pokémon. Por coincidência ele também é autista. Cresceu colecionando insetos na natureza, o que inspirou a criação dos personagens Pokémon.

Carol e a mãe, Daiany: uma luta diária para vencer as barreiras do preconceito e exclusão social

Motivo de orgulho

Se a filha está feliz com o resultado alcançado, a mãe, Daiany Vieira, 37 anos, Analista de Departamento Pessoal, está mesmo é ‘explodindo’ de felicidade. “Estou muito orgulhosa. Quando vi que ela havia conquistado o primeiro lugar foi uma vitória. É uma recompensa porque só a gente que está no dia a dia sabe como é o esforço dela para sair de casa, para ir a escola… Só vivendo o dia a dia sabemos o quanto é difícil”, disse a mãe sorridente ao lado da filha em entrevista ao jornal.

Daiany comentou que Carol tem um grau de leve autismo. Porém, sofre também de Transtorno de Deficit de Atenção (TDH ). “O deficit de atenção é o que mais estamos trabalhando com ela no momento para que possa se concentrar mais e conseguir fazer suas atividades”, explicou. A mãe contou do sofrimento do dia a dia da filha com o preconceito em relação ao autismo.

“Ela sofre muito preconceito ainda porque a interação social do autista é diferente. As pessoas da mesma idade da Carol estão em outros assuntos e as vezes ela acaba sendo deixada de fora”, lamentou, ao dizer que já está preocupada com o início da filha na universidade. “No colégio ela já tem o convívio com alguns amigos. Na universidade, terá de começar do ‘zero’ e isso me deixa apreensiva”, relatou.

Diagnóstico

O diagnóstico de Carol, para autismo, foi um alívio, falou Daiany. Disse que até então não tinha um ‘rumo’. Sabia apenas que a filha tinha algum problema. Ela informou que sempre era chamada na escola porque a filha não conseguia desenvolver as atividades. “Quando veio este diagnóstico o tratamento foi direcionado. Depois do alívio veio um sentimento de culpa porque a gente não compreendia ela. Queria que saísse, fosse nos lugares, que tivesse com mais gente. Mas para ela, isso era um sofrimento”, argumentou.

Com o tratamento os rumos mudaram. Tudo passou a ficar mais fácil. Carol passou a ser mais independente. “Eu digo que os autistas são especiais em todos os sentidos. Porque são puros. Tem um amor verdadeiro e um carinho sem igual”, disse.

Daiany encerrou a entrevista à TRIBUNA fazendo um apelo: “Queria muito que a sociedade deixasse de excluir pessoas autistas. O autismo pode surgir em qualquer família. A exclusão só traz sofrimento e dor. Meu pedido é que haja mais inclusão e mais política pública para o público autista para que estas pessoas não enfrentem tantas barreiras”, pediu.