Ex-comandante da PM de Campo Mourão é inocentado em caso do “falso federal”

O Ministério Público do Paraná (GAECO) pediu ontem, o arquivamento do procedimento investigatório contra três policiais militares de Campo Mourão, incluindo o Tenente Coronel Adauto Nascimento Giraldes, que comandava o batalhão. Eles eram suspeitos por colaborarem com a presença de um falso policial federal, que acabou se infiltrando no 11º Batalhão de Polícia Militar. O MP entendeu que, juntos, eles não praticaram nenhuma conduta ilícita, sendo apenas induzidos a um erro. O caso veio à tona no final do último ano, após Luiz Carlos Junior, o falso federal, ser preso em flagrante pelo próprio comandante do 11º BPM.

O caso

Luiz adentrou às portas da corporação se passando por um federal ainda em setembro de 2022. Chegou ali já recomendado por um outro Comandante, do 25º BPM de Umuarama, o Major Cláudio Roberto Longo da Silva. “Luiz chegou afirmando ser um federal. Eu acreditei porque já veio recomendado. E não o questionei”, disse Giraldes. Na época, Luiz alegou que estaria preparando uma grande operação. E pediu o seu apoio. O que foi, de pronto, atendido. Incluindo a companhia de um PM em suas façanhas. Faltou ao comando apenas um detalhe: comprovar a veracidade de tudo o que o sujeito falava naquele instante. Mas isso não aconteceu. Foi, certamente, o único erro do Comandante.

Em Campo Mourão, Luiz passou a andar com um Ford Focus – que nunca foi dele. E armado com uma pistola Glock, zero bala – que insiste em dizer que não é sua. Mas que a entregou à PM sem maiores pressões. Um vídeo prova a entrega da arma. O enredo é ainda um pouco mais trágico. Ao seu lado sempre esteve um PM, designado pelo próprio comando.

Então, nos 40 dias morando em Campo Mourão, Luiz agiu como um verdadeiro “171” – gíria do crime para mentiroso, malandro, aproveitador, estelionatário, usurpador. E passou a prender, autuar e, até ameaçar. Isso, sem nunca ter pertencido aos quadros de qualquer tipo de polícia. E a bem da verdade, “trabalhou” demais. Quase não parou. Foram três “bocas de fumo” fechadas. Outros três mandados de prisão cumpridos. Duas armas apreendidas, além de um contrabandista de cigarros preso. Isso tudo sem nunca ter sido policial.

Esta última façanha, inclusive, chegou a ser estampada na imprensa local. No primeiro dia de dezembro, ele colaborou para prender um sujeito, em casa, com muitos pacotes de cigarros contrabandeados do Paraguai. O detido e a mercadoria foram encaminhados à PF de Maringá. O desejo em ser um policial de verdade é evidenciado em um vídeo que ele mesmo fez, mostrando a apreensão e dizendo ser uma operação conjunta entre a Rotam e a PF.

Acontece que Luiz nunca foi um policial. Nem aqui, nem em Marrakech. Tampouco, um federal. Veio de Umuarama, onde nasceu em 1993, tendo uma infância normal, como a tantas outras crianças. Mas, na escola, professores teriam percebido algo diferente em seu comportamento: era muito inteligente. Acima da média. “Nas aulas de matemática, ele não apresentava as resoluções. Vinha logo com o resultado. Depois disso, através de especialistas, descobriram que o seu QI era muito elevado”, revelou Alzemide Ribeiro, mãe de Luiz. Então, diante do quadro, o menino passou a estudar, sempre, em colégios particulares, mesmo não gostando de frequentá-los.

Luiz

E, por ter muitas faltas, comprometeu uma possível trajetória de sucesso nos campos de futebol. “Ele era muito bom de bola. Tinha gente interessada em gerir a carreira dele. Mas devido às faltas na escola, deu tudo errado”, lembra a mãe. O menino teria se mostrado um craque de bola até os seus 15 anos, quando desistiu do sonho. Luiz concluiu o primeiro grau, mas jamais completou o segundo.

Já na adolescência a mãe percebeu que o filho tendia mais ao pragmatismo. Ou seja, gostava mais fazer a estudar, planejar. De uma certa forma, meter a mão na massa. Então seguiu os passos do pai, Luiz Carlos – morto há sete anos. Conhecido vereador de Umuarama, por duas gestões, foi apelidado como “Pastor Propaganda”, isso sem nunca ter sido crente. O nome se deu ao estilo: sempre usava paletó e gravata.

Antes de abraçar a Câmara Legislativa, o pai ganhava a vida fazendo propagandas em frente ao comércio local. “Pai e filho eram muito unidos. Luiz o ajudava nas propagandas e, depois, na política. Passou a seguir o pai”, disse Alzemide. Segundo ela, o menino nasceu às vendas. Com uma boa oratória, é capaz de vender a tudo. Imagine então, uma bela história policial, cujo protagonista, é ele mesmo.

Além de seguir os caminhos do pai, Luiz também atuava como uma espécie de X9 – gíria do crime aos delatores, os conhecidos caguetes. A “carreira promissora”, começou há 12 anos, ainda em Umuarama. Na época, tinha um tio dependente de drogas. E as cobranças da boca de fumo acabavam parando no colo do avô. Como a pressão dos traficantes era grande demais, Luiz decidiu adentrar à história, os delatando, um a um. Todos acabaram presos. O episódio teve consequências diretas: estreitou uma “amizade” entre ele e um policial. A partir daí, a vontade disfarçada em ser um homem da lei acabou, de certa forma, se consolidando através de denúncias, delações e uma pistola de verdade na cintura.

Giraldes

Giraldes é um homem polido. Fala bem e demonstra uma educação irretocável. Ele tem 34 anos como policial militar. Antes de chegar ao posto de comandante, pertenceu à corregedoria da PM e ao Gaeco. Segundo ele, “não tolera atitudes erradas”, ainda mais, dentro da própria corporação, que a defende desde os seus 18. E, devido ao caso do falso policial, acabou transferido de Campo Mourão.

“Ontem foi um dia de festa pra mim. O MP atestou que agimos dentro da legalidade. Nunca apagamos nada do celular de Luiz. As mazelas que eu passei são imensuráveis. Mas foi um grande aprendizado”, disse Giraldes à TRIBUNA. Enquanto os policiais de Campo Mourão foram inocentados pelo MP, Luiz continua preso em Curitiba.