Agenda de bom senso
Enquanto se discute no Supremo se a responsabilidade pelo isolamento é do Presidente ou é de governadores e prefeitos, quem está mesmo na ponta do Brasil real são os prefeitos. À exceção de prefeitos de grandes cidades, mais de 95% deles é que sofrem literalmente na pele e também na consciência, a responsabilidade sobre a saúde física e econômica de seus munícipes. E ainda cada dia mais perto da eleição municipal. Aqui em Brasília, o Presidente sofre pressões de todos os lados, mas quem é mais alvo de cobrança é o prefeito. Assim como o Presidente tem que se sujeitar a decisões do legislativo e judiciário, os prefeitos também sofrem essas restrições.
Vou citar um exemplo de um dos maiores centros de produção agrícola do país, Sinop, em Mato Grosso. Cito Sinop, porque lá estive quando o município tinha apenas 5 anos de idade. Hoje, aos 45 anos da fundação, tem quase 150 mil habitantes. Nesta crise sanitária, teve pouco mais de 10 casos confirmados e apenas um hospitalizado. E além da pandemia, mantém um alerta de dengue. Há poucos dias, com base em decreto do governador, a Prefeita foi para a TV anunciar, tendo como metas a saúde e a preservação da economia, a reabertura do comércio. “Foi preciso coragem para tomar decisões”- disse ela. Reabertura sem aglomerações, com distanciamento de 2 metros, máscaras, higienização de mãos e lugares, com a recomendação de ficar em casa quem não tiver absoluta necessidade de sair. Hotéis, feiras livres, lanchonetes e restaurantes reabertos mas não escolas. A Justiça restringiu a abertura, que não atinge missas e cultos, academias e ginásios. Na decisão, o Juiz argumentou “uma agenda de bom senso”.
Imagino quantas noites mal-dormidas de prefeitos exigidos por todos os lados, neste momento crucial de pressão de um vírus que não se conhece bem mas se sabe que está entre nós, e de uma crise econômica que se agrava a cada dia de parada no comércio, serviços e sobretudo nos avulsos e informais. Também quantas noites mal-dormidas de pais e mães de família a pensar na alimentação dos filhos no dia seguinte, muitos dependendo da merenda na escola fechada.
Nós, brasileiros, nos qualificamos como solidários. E é o que o momento exige. Solidariedade nos cuidados para não sermos vítimas ou condutores do contágio. E solidariedade para não sermos instrumentos do caos econômico que pode virar caos social. O drama que pesa sobre a cabeça de prefeitos, governadores e presidente também exige que, solidários, cumpramos uma agenda de bom senso, com racionalidade e cabeça fria.
Alexandre Garcia