“Natal?! Primeiro o boletim”

“Acho muita estupidez de alguém que crê em algo superior fazer o bem, e pregar 
que devemos fazer o bem aos outros para que se consiga algo bom em troca.
Tem que se fazer o bem, apenas porque é o bem, não esperar algo em troca.
Fazer o bem esperando algo em troca não é bem, é barganha”.

Donseti Helero Martins Júnior

    O boletim escolar sempre vinha em primeiro lugar. Antes da árvore de Natal. E principalmente nem podíamos falar em presente, sem antes apresentarmos à dona Elza Brisola Maciel, o boletim escolar, e, nesta época do ano, constando se tínhamos sido aprovados, ou não. 
    Como se agora estivesse ouvindo claramente a minha saudosa mãe a dizer, “Natal?! Primeiro o boletim. E não tinha, jamais teve, qualquer conversa, assunto que não fosse o boletim escolar final do ano letivo. 
    Cresci com essa sensação, uma espécie de trauma. As luzes natalinas, as músicas na televisão, nos carros de som, a cidade toda enfeitada, e em casa com o pinheirinho armado belamente, tudo na verdade era um frio na barriga, medo e ansiedade, o boletim era como a chave que abriria a porta pela qual entraríamos no mundo encantado natalino.
    Na cozinha, quando ela estava a preparar os assados e bolos, eu ali, bem menino a observá-la, e então ela ressalta, quando sai o seu boletim? Disse, na semana que vem. A dona Elza continuou os afazeres na imensa mesa, e eu continuei a observá-la. 
    Como mãe conhece os filhos! “Está com receio de não passar de ano, José Eugênio?” – indagou-me enquanto habilmente cortava a carne com uma faca grande que parecia passar bem perto do meu coração. Preferi não dizer nada, a não ser uma afirmação que ela iria retrucar – aliás, – palavra que ela gostava empregar quando tentávamos respondê-la mas já tirava nossa palavra com uma sentença incisiva, “não me retruque”!
    Pois bem, voltando ao assunto e aquela cena, afirmei, “sim, mãe, sem passar de ano, não tem presente!” – creio que até me expressei com tom professoral…
    Me enganei! Se reprovar de ano, não tem conversa, é castigo mesmo. Mas também tem o seguinte, ‘seu’ José Eugênio, é obrigação sua, para o seu bem, passar de ano. Não quer dizer que automaticamente vocês irão ganhar presentes. Não faço barganha! Quem ganhará com os estudos é você ao longo da vida. Nunca pense de fazer as coisas apenas quando tiver alguma recompensa. Não senhor!
    Era o início dos anos 1970, eu cursava o antigo primeiro grau (hoje ensino fundamental), sem jamais imaginar que, um dia, iria me tornar professor.
    Mas o trauma continua! Sem precisar mostrar o boletim, nós professores só entramos em férias se tivermos cumprido com todas as nossas obrigações!
    E o trauma continua! Até que tudo de fato termine (no caso o último dia 18) o clima de Natal provoca aquela sensação, eu fechava os olhos, tapava os ouvidos…Natal nem pensar se não apresentar o boletim.
    Passar de ano na minha meninice era não precisar levantar da cama tão cedo, era ficar um pouco mais tarde vendo televisão, brincar…A sensação que tenho agora. 
    Se era dever o ano inteiro para aprender, a grande lição de minha querida mãe sempre foi essa, obrigação é um dever, sem troca, recompensa, barganha. 
Porém, ela reconhecia e parabenizava todos os seus filhos. Ganhei muitos presentes! Mas só depois do boletim: “Aprovado”!              

Fases de Fazer Frases (I)
    Saiba de tudo o que não sabe e começarás a aprender.

Fases de Fazer Frases (II)
    Dito, medito. Tido, metido. Cito, tecido.

Fases de Fazer Frases (III)
    Distrair. Diz trair. Atrair. Trair. Tudo é ir.

Olhos, Vistos do Cotidiano
    Assistindo ao programa esportivo BEM, AMIGOS, (segunda anterior), por diversas vezes o narrador Galvão Bueno falou “há anos atrás”, “há muito tempo atrás”. Há, no sentido de tempo já referencia ao tempo passado, portanto, pleonasmo. Não é de hoje tal vício. Pode se dizer corretamente “anos atrás”, sem o há. 
E se for sobre futuro, é só a que se usa, como, o homem foi condenado a cinco anos de prisão. Ou fulano vai se formar daqui dois anos.  

Caixa Pós Tal
    “Agradeço, em nome de toda a minha família, pelas lindas palavras em homenagem ao meu querido pai. Serviu como um consolo nesse momento doloroso. Um abraço”. Registro as palavras da Gleise Maria Santini Rieke Nihei, em referência ao pai dela, que nos deixou na semana passada, tema principal da Coluna anterior, intitulada RIEKE, A INTEGRIDADE COMO PROCESSO. O colunista é que é grato pela atenção da família.

Farpas e Ferpas
    Nada pode ter graça maior do que uma piada bem sem graça.

Reminiscências em Preto e Branco
    Passa-me o tempo, que deixa em mim como marcas as minhas rugas. 
Me importo com ele, não com elas. 

José Eugênio Maciel | [email protected]