Sim, nós podemos! – por Gilmar Cardoso

“Eu quero a vida de meu povo” (Ester, 5,3)

Dia 8 de março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. Embora muitas recebam flores no trabalho, cartazes com mensagens bonitas, bombons dos namorados/maridos, beijos dos filhos e muitas outras homenagens neste dia tão importante, ainda ouve-se muito por aí o velho comentário: “Mas que besteira! O dia da mulher é todo dia.” É claro que essa brincadeira tem um pouco de verdade, afinal todo dia é dia de celebrar a vida. Mas a simbologia do dia 8 de março é muito forte para ser deixada de lado.

Diferente de muitas datas comemorativas, o Dia Internacional da Mulher não foi criado pelo comércio; ele é fruto de lutas pelos direitos das mulheres. Nesta data dedicada à mulher, avó, mãe, esposa, filha, irmã e amiga; alegra-nos perceber que, cada dia mais, cresce a consciência da dignidade da mulher e de sua específica contribuição na construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária.

O tema do Dia Internacional das Mulheres (8 de março) 2020 é: “Eu sou a Geração Igualdade: concretizar os direitos das mulheres”. Em 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) oficializou o dia 08 de março como o Dia Internacional da Mulher. A fixação da data é o reconhecimento de um longo processo de lutas, organização e conscientização das mulheres, mas também de toda a sociedade, na maior parte do mundo. Ao longo dos anos, muitas têm sido as vitórias das mulheres: conquistaram direitos como o de frequentar escolas, votar e se candidatar a cargos políticos, praticar esportes e representar o país em competições esportivas, entre outros. Também foram criadas delegacias de proteção à mulher e campanhas direcionadas à saúde da mulher.

Entristece-nos, no entanto, o cenário de invisibilidade em que se encontra a maioria das mulheres, bem como o impedimento de sua presença em importantes espaços de decisões. Some-se a isso o desafio da pobreza, da exploração do trabalho e tráfico humano, das violações das culturas e suas crenças, que evidencia as graves violações dos direitos das mulheres. Os avanços e conquistas das mulheres, garantidos por lei e/ou por políticas públicas, não escondem as deficiências de muitas ações voltadas ao cumprimento e efetivação dos direitos da mulher.

No Brasil, atualmente, há mais mulheres que homens e elas ocupam cada vez mais espaço no mercado de trabalho, e já são responsáveis pelo sustento de  24,9% dos domicílios brasileiros. No que diz respeito à igualdade entre homens e mulheres, apesar de erradicadas as disparidades no que se refere à educação e saúde, nenhum país possui igualdade total entre homens e mulheres. E os pontos mais problemáticos continuam a ser a oportunidade profissional e econômica e a participação política. Ainda temos, por exemplo, três grandes obstáculos: o abismo salarial entre os dois sexos, os poucos cargos políticos ocupados por mulheres e a desigualdade no acesso à educação. As mulheres ocupam a maioria dos bancos das universidades e estudam mais que os homens, mas em termos proporcionais, ingressam menos que eles no Ensino Fundamental. A participação política também é desigual, pois apesar de mais da metade da população ser do sexo feminino, no Poder Legislativo a média de mulheres é de apenas 12%.

No que se refere a conquistas nas leis, o movimento das mulheres pela igualdade tem obtido, ao longo da história, avanços graduais e constantes. No Brasil, o primeiro marco, já referido anteriormente, foi o ano de 1932, ocasião em que se estendeu  a mulher o direito ao voto. Em 1988, veio a maior conquista, pois a Constituição Federal consagrou pela primeira vez na história do país a igualdade de gênero como direito fundamental. E em 2002, o Novo Código Civil consolidou as mudanças constitucionais.

Apesar dos grandes avanços obtidos pelas mulheres, o Dia 8 de março continua a ser uma data para recordar e denunciar as inúmeras situações de violação de seus direitos e de sua dignidade. Milhares delas são vitimas da discriminação, do desrespeito étnico-cultural, do tráfico para exploração sexual e laboral e de inúmeras outras formas de violência. Para muitas, o lar, lugar sagrado de proteção, converteu-se em espaço de dor e sofrimento. A Lei Maria da Penha é outra vitória das mulheres, que vem combater esta violência doméstica e o feminicídio de que são vítimas.

A igreja nos aponta a presença constante das mulheres na Bíblia. No Evangelho, há o sinal concreto de que caminhavam junto a Jesus: “em Mateus, são as matriarcas do Messias (Mt1,1-16); em Lucas, elas têm estatuto de discípulas (Lc 8,1-2); em João, são elas que ficam ao pé da cruz quando os homens fogem cheios de medo (Jo 19,25-27); em Marcos, são elas que em primeiro lugar, vão ao sepulcro a procura do Mestre recebendo a tarefa de comunicá-lo aos demais (Mc16,1-8)”.

A própria Campanha da Fraternidade de 2020, inspirada na parábola do Bom Samaritano (Lc 10, 25-37) propõe a reflexão sobre a defesa da vida e compromisso de toda cristã e cristão de sentir compaixão, cuidar dos caídos  e compreender a palavra de Jesus: vai e faça o mesmo como apelo de solidariedade,  para que olhemos a realidade das mulheres nos meios em que convivemos,  vítimas de tantas situações não cristãs. Além do que, ainda, protagoniza como ícone, a Santa Dulce dos Pobres, o anjo bom do Brasil; que antecipou em muitas décadas a chegada das mulheres a posições de liderança em um tempo em que a sociedade relegava um papel subalterno às mulheres.

A data dedicada à mulher nos conclama, ainda, a aplaudir as mulheres por suas conquistas ao longo da história marcada pela discriminação e pelo preconceito. É cada vez mais forte sua presença na família, no mundo do trabalho, na ciência, na educação, na política, na Igreja e na sociedade. Somos testemunhas do papel decisivo da mulher no processo de redemocratização do País. Não sem razão, comemoramos os 88 anos do voto feminino, uma conquista histórica. “Quando uma mulher entra na política, muda a mulher; quando muitas mulheres entram na política, muda a política”, disse-nos Michelle Bachelet, a presidenta do Chile.

Ao saudá-las, neste dia, renovamos nosso reconhecimento a cada uma das mulheres, por sua insubstituível presença e participação e por seu protagonismo na construção de uma nova sociedade, e rogamos a Deus fortalecê-las na luta de cada dia e abençoá-las em todos os seus caminhos.

GILMAR CARDOSO, advogado, poeta, membro do Centro de Letras do Paraná e da Academia Mourãoense de Letras.