A ‘senhora’ Campo Mourão e seus 74 anos

A exemplo do mundo, a vida voltou a Campo Mourão. Uma pausa de quase 18 meses calou quadras de esportes, eventos, teatro, salas de cinema e até festas de casamento. Ruas ficaram vazias. O medo invadiu as casas. E, embora a passos lentos, a cidade continuou sua jornada. Agora, aos 74 anos de emancipação política (o aniversário é dia 10 de outubro, domingo), as terras vermelhas seguem o seu destino e, junto a elas, a sua gente. Hoje, com população aproximada de 100 mil habitantes, é comum escutar “forasteiros” – agora mourãoenses de coração -, elogiarem o município. Afinal, é ou não é um lugar pra nunca mais sair?

“Forasteiro” de Caconde, Minas Gerais, Marcos Corpa é agora o conhecido médico de Campo Mourão. Sua chegada aconteceu em 1976. Foi quando alugou uma pequena sala para montar o Raio X. Não parou mais. Ele trazia à cidade tecnologia da época. Foi um visionário. E, pela visão, acabou conquistando todos os seus desejos.

Na empoeirada Campo Mourão, “Marcão” – para os íntimos -, se intrometeu em tudo. Preocupado com a comunidade, desejou melhorar a educação. O resultado hoje, chama-se “Integrado”. Participou da Associação Comercial e Industrial (Acicam). Atuou em ações junto ao Rotary, colaborando para melhorar a vida de quem precisava. E, mesmo nunca sendo político, fez mais que muitos deles. É o tal “fogo no rabo”, que seus pais tanto falavam que ele tinha.

Marcos jamais pensou em deixar Campo Mourão. Aqui aprendeu e conquistou quase tudo. Logo ao chegar, foi tomado por um encanto. Encanto que só cresceu, principalmente, com as conquistas da vida: família e amigos. “Eu só nasci em Caconde. Mas a minha terra mesmo é Campo Mourão. Daqui não saio. Jamais”, disse.

Economia

A cidade é movida ao agronegócio. Tanto é que mantém a sede da Coamo, umas das maiores do setor, do planeta. Puxada pela agricultura, a economia vem travando combates diários contra os efeitos da pandemia. Ainda não está fácil. Mas nada que dure pra sempre, ainda mais, contra uma população trabalhadora. Difícil de derrubar.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que, em 2019, o salário médio mensal em Campo Mourão era de 2.5 salários mínimos. A proporção de pessoas ocupadas em relação à população total era de 32.2%. Na comparação com os outros 398 municípios do estado, ocupava a posição 20. Já, frente aos municípios do país, ficava na posição 482, de 5570. Os números não foram atualizados no pós pandemia.

Se até pouco tempo a cidade tinha as ruas desertas – efeitos da pandemia -, agora tudo parece ter voltado ao normal. A verdade é que a vida voltou. Já se observa comércio e o centro movimentados – com menos carros. A vida noturna – uma importante fatia da renda da cidade, segmento mais afetado pelos vírus -, também começa a ressurgir. Já há esperança no ar.

O agora aposentado juiz de direito, Rui Antônio Cruz, também adotou Campo Mourão como sua. Nasceu em Bento de Abreu, no interior de São Paulo, e depois de 38 anos aqui, garante que daqui, não sairá mais. Homem simples, jamais deixou que o peso da “caneta” interferisse em sua vida social. Na cidade fez amigos, participou de ações, colaborou ao bem comum. “Não sou juiz, estava juiz. Tenho os mesmos problemas que qualquer pessoa. E é por isso que jamais me senti superior aos outros”, disse.

“Cumpri minha missão na cidade. Se deixei de fazer algo foi pelas minhas limitações como homem”, afirmou Cruz. Segundo ele, fez tudo o que pode. A justiça foi feita. Ficaram as lembranças, a família e os amigos aqui conquistados. E isso, pra ele, definitivamente, não tem preço. Rui é um legítimo mourãoense, daqueles com “craca” vermelha na sola dos pés.

História

Muita gente não sabe. Mas o município deve muito ao governador da província de São Paulo, Dom Luiz Antonio Botelho e Sócio Mourão. Ele foi o responsável por, entre 1769 e 1770, enviar uma expedição para a região do Rio Ivaí, na época chamado de Rio Dom Luiz. Setenta e cinco homens foram comandados pelo Capitão Estevão Ribeiro Baião e Francisco Lopes da Silva. Tinham a missão em descobrir e batizar as novas localidades.

Ao avistarem um enorme campo aberto, batizaram o local de “Campos Mourão”, posteriormente mudado para “Campo do Mourão”, e, mais tarde, simplificado para “Campo Mourão”, em homenagem ao governador de São Paulo. A história do município é dividida em três momentos: primeiro o descobrimento pela expedição de Dom Luiz. O segundo pela chegada das primeiras famílias, atraídas pela nova terra. E terceiro, pela criação do município.

Saneamento e Saúde

De acordo com o IBGE, Campo Mourão apresenta 75% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Mantém 97.8% de domicílios urbanos em vias públicas com arborização. E 72% de domicílios urbanos em vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio). Os dados são de 2018. E já podem ter mudado.

Também conforme o IBGE, a taxa de mortalidade infantil média na cidade é de 12.92 para 1.000 nascidos vivos. As internações devido a diarreias são de 0.3 para cada 1.000 habitantes. Comparado com todos os municípios do estado, fica nas posições 135 de 399 e 320 de 399, respectivamente. Quando comparado a cidades do Brasil todo, essas posições são de 2360 de 5570 e 3907 de 5570, respectivamente.

Atualmente, a cidade dispõe de um belo quadro urbanístico, com modernas edificações, parques à disposição da população, investimento na área gastronômica e bons supermercados. Na saúde, a Santa Casa, mesmo com poucos recursos, garante o atendimento para Campo Mourão e toda a região da Comcam. Também conta com boas universidades (uma estadual, duas particulares e uma federal). Aliás, reflexo direto é a chegada de estudantes de todo o país à cidade. As consequências são o giro maior da economia local.

“Forasteiro” do Rio de Janeiro, o promotor de justiça, Marcos Porto Soares, já é mourãoense há 15 anos. “Noto uma transformação incrível na cidade. A energia se renova a cada instante com o encontro dos que chegam de fora, com os que aqui nasceram”, diz. Em sua visão, uma cidade para frente, que brilha no meio do Paraná. A cada instante uma novidade e que não para no tempo. “Fiz e continuo fazendo muitos amigos, no trabalho, no esporte, na música e no dia a dia”, revelou.

Para ele, Campo Mourão também é uma cidade de muitos flamenguistas, o que, de certo modo, continua o aproximando do Rio. “Fisga pelo emocional mesmo. Além disso, mesmo sem o mar, trata-se de uma excelente cidade para se viver. A linha do horizonte é plena, os rios, a usina, a praça da igreja, tudo num encaixe perfeito. Amo Campo Mourão”, afirmou.

A senhora Campo Mourão segue em frente. Há muito ainda por fazer, a melhorar. Nem tudo são flores. Há que se melhorar na saúde. No déficit habitacional. Na geração de emprego. Mesmo a pausa pandêmica não a derrubou. A afetou. Feriu famílias, deixou sequelas, quebrou empresas. Muitas perdas foram sentidas. Mas o tempo é o senhor da razão. É bem possível que, agora, olhando para trás, vê-se que o pior já passou. É hora de seguir a vida. Ela voltou.