As ruas de Adriano, José, Alan, Claudiomir e Franciele

Desde o início da pandemia, tornou-se comum pessoas em situação de rua se abrigando em diferentes locais de Campo Mourão. Até julho, Adriano, 31, morava numa tapera aos fundos da Casa da Cultura. Dormia sobre uma fossa e se mantinha aquecido com a ajuda de apenas uma coberta. Sem emprego e com dores em uma das pernas, José Luiz, 39, foi encontrado morando num vestiário de um campo de futebol do Lar Paraná. Vivia sem luz e sem quase nada mais. Esta semana, outras cinco pessoas foram localizadas dividindo um prédio abandonado na área central.

Um deles é Alan. Conta que nasceu em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, sendo abandonado pela mãe ainda aos 11 anos. “Meu pai morreu num acidente de caminhão quando eu tinha 8. Minha mãe conheceu outro sujeito depois e acabou sumindo. Me deixou sozinho”, relata. Aos 21, ele é alcoólatra. Vive em função do álcool. “Bebo até álcool de posto”, disse.

Alan é um nômade. Anda de cidade em cidade em busca de algo que, nem mesmo ele ainda descobriu. Do tipo que segue as placas, mas anda sem direção, sem rumo. E do jeito que aprendeu a viver, assim está bom. Ele não tem nada além das roupas do corpo e de muita sede. Aliás, acabou secando uma garrafa de aguardente durante a entrevista. Mais adiante acendeu um palheiro e degustou a prosa toda.

Alan teria chegado a Campo Mourão há cerca de quatro meses. Com as doses etílicas, ele não se recorda ao certo. Tem uma grande cicatriz na face esquerda do rosto. Consequência das noites de bebedeira. Caiu sobre uma garrafa de vidro. “Bebo pra esquecer do que sou. Com o álcool acabo me esquecendo da fome e das coisas que já passei. É uma espécie de cicatriz da vida. Fecha as feridas”, disse.

Além de Alan, o local abriga o casal Franciele e Claudiomir. Sem emprego há três meses, os dois acabaram saindo da casa da mãe dela. E, sem um teto, o destino foi a rua. “Nós não podíamos ficar dependendo da mãe dela. Então tomamos a decisão de buscar algo para nós. Mas até agora, só encontramos desgosto”, disse Claudiomir.

Valdemir também estava lá. Segundo ele, ganhou as ruas após descobrir a traição da esposa. Até seis anos morava em Iretama, numa casa ao lado da companheira. Mas a desilusão amorosa mudou tudo. Ao encontrar as sarjetas, conheceu o álcool. E se afundou de vez. “Eu até tomava umas. Mas agora embalei como se estivesse numa descida”, disse.

Adilso, mesmo tendo família em Campo Mourão, preferiu as ruas. Também com problemas pelo álcool, decidiu a “liberdade” das esquinas às cobranças da companheira. Ela não o aceita bebendo. O jeito então foi se espalhar pelo chão imundo de locais abandonados. E ele não está nem aí. Segue vivendo um dia por vez, com um gole atrás do outro.

Juntos, os cinco amigos se amontoam numa espécie de quarto abandonado, de uma edificação aberta no coração da cidade. Ontem, o almoço foi com a ajuda de algumas panelas velhas, improvisadas sobre a lenha. Teve arroz, feijão e ovos. Alimentos ganhos em portas de supermercados.

Banheiro não existe. Quem dirá chuveiro. Alan não toma banho há quatro meses. Valdemir, há seis. Além de restos de aguardentes, o chão reserva espaço a poucas cobertas, além de pertences dos cinco. Somente o casal, Claudiomir e Franciele, disse ter esperanças em deixar as ruas. Ela, inclusive, não consegue andar. Segundo contou, sofreu um acidente de moto, há um ano. “Eu queria ter um carrinho para fazer coleta de recicláveis. Mas quando tento pedir, sou visto como um ser invisível. Sofremos muita humilhação”, disse o companheiro.

Em tempo: Adriano, mencionado no início desta reportagem, conseguiu ajuda da TRIBUNA para localizar sua irmã, em Rondônia. Ele foi acolhido e hoje está longe das ruas. Trabalha no sítio da família dela e está muito feliz.