Aumento de pessoas em situação de rua em Campo Mourão é debatido na Câmara
Na noite dessa segunda-feira (5), foi realizada uma audiência pública na Câmara Municipal de Campo Mourão, com o intuito de discutir o crescente número de pessoas em situação de rua no município. O evento, que durou cerca de três horas, contou com a presença de vereadores, representantes de órgãos públicos, entidades assistenciais, profissionais da saúde e assistência social, além da população em geral. O encontro teve como tema central “O aumento das pessoas em situação de rua em Campo Mourão”, conforme proposto por representantes do Poder Legislativo.
A audiência foi convocada após um requerimento apresentado pelos vereadores Márcio Berbet, Tião do Karatê e Sidnei Jardim, que expressaram preocupações com a crescente presença de pessoas em situação de vulnerabilidade nas ruas da cidade. “Eu vejo que é de extrema necessidade a gente estar conversando sobre esse assunto”, afirmou Berbet. Ele ressaltou a importância do debate para encontrar soluções práticas, enfatizando que a discussão não se limitava ao Projeto de Lei proposto por ele sobre o tema, ainda não finalizado, mas sim à busca de alternativas efetivas para a problemática.
À TRIBUNA, Berbet explicou que o objetivo da proposta não era a criminalização das pessoas em situação de rua, mas sim evitar que itens como fogões e outros objetos – como têm sido vistos na cidade – permaneçam nas ruas. “Essa audiência pública não é para a gente discutir o Projeto de Lei, até mesmo porque ele nem chegou para parecer jurídico. E o Projeto de Lei tem que ser feito uma correção, porque ele não proíbe os moradores de rua, ele proíbe que os moradores de rua depositem objetos com fim permanente de ficar na rua”, esclareceu.
Em resposta à proposta, após o anúncio do projeto, no início deste mês, o Conselho Municipal de Assistência Social, formado por 28 conselheiros, emitiu uma carta aberta sobre o referido Projeto de Lei, entendendo-o como inconstitucional. Para os conselheiros, o projeto “criminaliza a pobreza e viola direitos fundamentais”.
“Nós, Conselho Municipal de Assistência Social de Campo Mourão (CMAS), órgão colegiado responsável por orientar, acompanhar e fiscalizar a formulação e execução das políticas de assistência social no município, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS, Lei n° 8.742/1993), manifestamos nosso posicionamento contrário ao Projeto de Lei (PL) em questão, que busca regulamentar a permanência de pessoas em situação de rua no município. A proposta é profundamente inconstitucional, socialmente regressiva e revela uma desconexão total com as necessidades reais da população mais vulnerável”, diz um trecho da carta.
Os representantes defendem que a solução do “problema” não está na repressão, mas sim na necessidade de políticas públicas. “O município vive um déficit crônico de serviços essenciais para acolher pessoas em situação de rua. Não há vagas suficientes em abrigos (atualmente a Casa de Passagem conta com 24 vagas), faltam recursos e equipes suficientes para os programas de reinserção social, assistência psicossocial e acesso à moradia digna – direitos garantidos pelo Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/2001) e pelo Artigo 6° da Constituição Federal”, pontua outro trecho.
Após explanação detalhada pela secretária de Assistência Social, Márcia Calderan de Moraes, sobre a realidade enfrentada não apenas em Campo Mourão, mas no Brasil como um todo, com a população em situação de rua, as representantes da área assistencial no município foram questionadas pelos vereadores sobre alguns desses trechos apontados na carta, especificamente em relação ao número de vagas em abrigos no município para suprir a demanda no atendimento dessa população.

Um dos pontos levantados pelo vereador Sidnei Jardim, por exemplo, foi que os dados apresentados pela secretária e a carta do conselho se contradizem. Márcia contestou. “Nós temos que ter um leque de opções: temos que ter Casa de Passagem, Centro-POP, comunidades terapêuticas, trabalho, renda, para que cada pessoa se encaixe em um modelo. Então, eu não entendo essa discussão de ter ou não ter vaga; nós temos que ter uma rede, e a rede inclui assistência, saúde, trabalho, moradia, segurança, as políticas públicas, é isso”, defendeu ela durante a sessão. Além disso, ela destacou que, muitas vezes, os serviços prestados localmente esbarram no “arcabouço legal” nacional e estadual, que precisa ser respeitado.
“Nós somos bastantes criticados por nossas ações, talvez, algumas pessoas acham que não são efetivas, mas é preciso entender que nós temos uma condução, e que não é do município, ela vem a nível nacional, estadual, até chegar nos municípios. Nós temos um arcabouço legal que tem que ser respeitado”, disse.
A secretária também compartilhou a visão da administração municipal sobre os serviços prestados às pessoas em situação de rua. “A Secretaria da Assistência faz o seu papel. É claro que a gente sempre tem que buscar melhorar, ampliar os serviços, e essa é uma busca constante nossa”, afirmou.
Márcia ressaltou que a cidade tem cumprido suas obrigações em relação ao atendimento a essas pessoas, com o suporte de programas como o CREAS POP, um projeto-piloto que oferece acolhimento, serviços de saúde e encaminhamentos para o mercado de trabalho.
Ela falou, ainda, sobre a ampliação dos serviços, com a criação de um novo Centro-POP, que oferecerá ainda mais suporte, incluindo oficinas profissionalizantes. Contudo, a secretária alertou que o serviço só pode ser oferecido e não imposto. “Nós não podemos obrigar ninguém a fazer o que não quer”, ressaltou.
Os números apresentados pela secretaria indicam que, até o primeiro trimestre de 2025, mais de 80 pessoas em situação de rua foram abordadas em Campo Mourão, sendo que a maioria possui famílias na cidade. Entre as ações destacadas, esteve a abordagem social, que permitiu o atendimento de 343 pessoas no período, com 93 abordagens feitas nas ruas do município.
Além disso, o município mantém parcerias com entidades como a Casa de Passagem, que oferece acolhimento institucional a pessoas em situação de rua, além de alimentação, higiene e encaminhamentos para outras redes de apoio. “São dois fatores: existir o serviço, que possa acolher, e a vontade daqueles que estão na rua de serem acolhidos”, explicou Márcia.
A audiência também foi marcada por críticas sobre a ausência de várias entidades convidadas para o evento, o que levantou questionamentos sobre a efetividade da participação da sociedade civil nas soluções propostas. Após diversos debates entre os participantes, a expectativa é que, com o engajamento de todos os atores envolvidos, novas políticas públicas sejam propostas para ajudar a transformar a realidade das pessoas em situação de rua e da cidade como um todo.
Serviço
A audiência pública está disponível, na íntegra, no canal do YouTube da Câmara Municipal de Campo Mourão: https://www.youtube.com/live/tqX2Ql2zAic