Moradores denunciam perturbação de sossego em bares de Campo Mourão

Som excessivo, conversa alta, barulhos de carros cantando os pneus, ‘pipocos’ causados por motocicletas em alta rotação, e até pessoas urinando no portão de casa. Esta é a situação enfrentada há mais de cinco anos pelo morador de Campo Mourão, o cartorário Arlindo Piacentini Filho, 67, que há mais de 30 anos reside na Rua Roberto Brzezinski, esquina com a Avenida Capitão Índio Bandeira. A paz de sua família e pessoas que residem ao entorno acabou após a abertura de bares no local, segundo o morador. Ele responsabiliza o “Boteco do Brizola”. 

“A baderna está demais. Estou vendo falta de interferência do poder público. Não é possível ali continuar como está. Há quatro anos estou  reclamando na Fiscalização da prefeitura, no Ministério Público e na Polícia Civil”, disse. Após idas e vindas sem a resolução do problema, Filho ingressou com ação na Justiça contra o município, que segundo ele, está sendo negligente à situação. 

O cartorário relata que já flagrou cenas aterrorizantes no local. “Sem o menor pudor alguns chegam com o carro na frente da casa dos vizinhos e já vão fazendo xixi ali mesmo. Tenho imagens. Já mandei inclusive para a Polícia Civil imagens de gente traficando ali na frente”, falou. Filho disse que por causa da situação teve de contratar dois seguranças para cuidar de um salão comercial, que fica ao lado dos bares. “Todo dia de manhã tenho que lavar ali na frente por causa do cheiro de urina. Isso não é mais possível aguentar”, criticou. 

Ele falou que em um dos casos sua esposa chegou a discutir da sacada com uma moça que já havia abaixado a roupa para urinar no recuo de sua residência. “A moça teve audácia de chamar minha esposa de coroa e mandou ela descer para ‘conversarem’”, falou.  Ele disse que outra situação triste é quando chega o horário de fechamento do estabelecimento. Neste momento alguns frequentadores aumentam o volume do som de carros, saem cantando pneus, fazem gritaria e ainda deixam lixos espalhados pela via pública.  “De tão alto o som dos automóveis, chega a tremer os vidros das janelas de casa. Onde estão nossas autoridades?”, questiona.

Outra situação denunciada pelo cartorário, é que o local é quase sempre frequentado por menores de idade. “Sempre tem adolescentes se pegando ou gente fumando maconha e crack. Acontece de tudo naquela esquina”, ressaltou. Ele disse que está reunindo famílias de Campo Mourão para buscar ajuda do Secretário de Segurança Pública do Estado. “Tenho um bom acesso com o Governador do Estado e vou procurar todos os meus direitos. Agora vamos ao extremo. Chega!”, desabafou.  

Não muito longe dali, na Avenida Irmãos Pereira, entre as Ruas Edmundo Mercer e São Josafat, o produtor rural, Theonaldo Kloster Ribas, 62, enfrenta o mesmo problema. Ele reside há mais de três décadas no local e diz que após a abertura do “Integração Bar”, o sossego da vizinhança acabou. O problema é o som alto gerado pelo local.  “Está terrível. Até duas, três horas da madrugada com som alto. Não tem como ter paz”, reclamou. 

Ele disse que já denunciou a situação à Polícia Militar e que foi orientado a fazer um abaixo-assinado. Da mesma forma foi orientado pela prefeitura também, informou. Ribas relatou que no desespero, em um determinado dia saiu com uma imagem de Nossa Senhora em frente a sua residência e começou a rezar. A situação chamou a atenção de frequentadores do bar, que chegaram o acusar de blasfêmia. 

“Fiz isso para dispersar as pessoas e avisei que se voltassem eu faria novamente”, disse. O agricultor falou que já reclamou com o dono do bar sobre a situação, mas que nada foi feito. “Até para vereadores já pedi ajuda, mas ninguém ajuda a resolver problema”, afirmou.

Ribas acrescentou que se nada for feito ‘alguém ainda vai cometer uma loucura’. A TRIBUNA obteve informações de que um vizinho do bar, inconformado com o som excessivo e barulho, saiu há alguns meses atrás na sacada de seu sobrado e ameaçou a atirar em algumas pessoas que estavam no local. “Lamentável chegar a uma situação dessas, mas não dá para aceitar que isso continue”, falou. 

Um vizinho do Integração Bar, disse à TRIBUNA que chegou a sair com uma santa na frente de casa e começou a rezar para dispersar frequentadores do local

A moradora Inez Verginia Panceri, 57, que reside ao lado do “Integração”, também reclama do barulho excessivo no local. Ela chegou a representar contra o proprietário do estabelecimento, que teve uma bateria apreendida pela Polícia Militar no último sábado (17). “Todo mundo tem o direito de ter seu estabelecimento e trabalhar. Mas que seja dentro das regras”, afirmou. Ela reclama que no local tem música ao vivo, mas não há qualquer acústica para impedir a saída do som do estabelecimento. “De quarta a domingo não temos paz. A nossa vida acabou”, critica. 

Ela falou que as filhas de uma moradora em frente ao bar, que sofre de Alzheimer, estão entrando em pânico por causa do barulho. “Os vidros da casa tremem com o som alto”, relatou. Inez informou que como não consegue resolver a situação, moradores estão agora fazendo um abaixo-assinado para ser encaminhado ao Ministério Público. “Moro aqui há 25 anos e não vou deixar a minha casa. Não estamos pedindo o fechamento do bar. Todo mundo tem direito de trabalhar e se divertir, mas sem atrapalhar os outros. E tem condições disso”, acrescentou. 

Donos de bares se defendem. Brizola está vendendo boteco após denúncias

A TRIBUNA ouviu os proprietários dos dois estabelecimentos em questão. José Carlos Gonçalves Pereira, mais conhecido como Brizola, dono do “Boteco do Brizola”, disse que a situação na redondeza onde funciona seu estabelecimento ficou ‘complicada’ após a abertura de outro bar na esquina onde funcionava uma revenda de gás. “Tudo que acontece nesta esquina colocam a culpa em mim, o que é injusto”, defendeu-se.

Ele tem seu ponto há oito anos no local. Segundo Brizola, depois que abriu outro bar na esquina, há cerca de 5 anos, as confusões tiveram início. “Confundem este outro bar com o meu”, lamentou. Devido o desgaste causado por denúncias e multas já feitas pela prefeitura, ele disse que colocou seu bar à venda. “Não aguento mais ir em Ministério Público”, falou. 

Brizola disse também que a escuridão na Rua Roberto Brzezinski, entre as Avenidas Capitão Índio Bandeira e Irmãos Pereira está atraindo pessoas má intencionadas. “Gente de outros lugares da cidade vem consumir drogas ali porque é muito escuro”, disse, ao comentar que já informou a prefeitura do problema.  

Referente à sujeira na rua, ele comentou que após o fechamento do bar, algumas pessoas ficam de carro na calçada consumindo bebidas alcoólicas adquiridas em outros locais, deixando a rua suja. O Bar do Brizola funciona de segunda a quinta-feira até meia noite e sábados até as 2 horas. Brizola mantém 5 empregados no local e está com o alvará e todos os impostos em dia. 

“Integração Bar”

O proprietário do “Integração Bar”, Vinicius Giose, inaugurou seu estabelecimento em fevereiro deste ano. O local emprega 15 pessoas e também está com alvará de funcionamento liberado pela prefeitura.  O bar funciona de quarta a quinta-feira até a meia noite e de sexta a sábado até as 2 horas da manhã. 

Segundo ele, a melhor forma para resolver o problema é o diálogo. “Não adianta procurar a polícia ou Ministério Público que não vão fechar o estabelecimento. Investi alto e aqui é o meu trabalho e de mais 15 pessoas”, avisou. Ele disse que soube da perturbação de sossego somente quando a polícia chegou ao local. “Ninguém nunca tinha me procurado antes para reclamar de alguma coisa. Eu entendo que o som alto pode ter incomodado algum vizinho, mas era só ter me procurado”, disse.

Giose comentou que após ter tomado ciência da situação chegou a percorrer a vizinha para saber se estava incomodando mais alguém e deixou seu número de telefone para possíveis futuras queixas. “Onde fui me disseram que não estava incomodando, até falaram que por causa do fluxo de pessoas o local ficou mais seguro”, falou.

Ele disse que após ciência das reclamações contratou uma equipe especializada para fazer um projeto de mitigação do som, para diminuir os ruídos. A expectativa é que o trabalho seja concluído nos próximos três meses.  “E se isso não adiantar vamos buscar outros meios. Não queremos prejudicar ninguém, mas também não podem querer impedir nosso trabalho”, comentou. 

“Já fizemos tudo que tinha de ser feito nos limites da legislação”, diz secretário 

Procurado pela TRIBUNA para comentar o caso, o secretário de Ouvidoria e fiscalização de Campo Mourão, Cristiano Calixto, comentou que toda denúncia que chega à secretaria é acompanhada. “Nestes casos [dos bares], o que tinha de ser feito dentro dos limites da legislação, que confere ao poder de polícia administrativa já agimos. Posso garantir que não há omissão ou negligência de nossa parte. Já fizemos notificações e também já multamos estes estabelecimentos”, falou. 

O secretário disse que foi realizada recentemente reunião entre o Ministério Público, prefeitura e donos de bares para discutir o assunto. Segundo ele, inclusive a questão está sub júdice. “Estamos em uma cidade universitária, temos 10 mil jovens de Campo Mourão e jovens de outras cidades que vem para cá. Estes problemas tinham antigamente em outros locais. Se nós embargarmos estes estabelecimentos a juventude irá para outro local. É um problema social e existe em toda cidade”, comentou Calixto. 

O secretário de Ouvidoria e fiscalização de Campo Mourão, Cristiano Calixto, comentou que toda denúncia que chega à secretaria é acompanhada

De acordo com o secretário, estes estabelecimentos estão com alvará de funcionamento em dia e são atividades permitidas nestes locais dentro da Lei do Zoneamento. “Todos têm alvarás expedidos a título precários, tem vigilância sanitária, e estão com seus impostos em dia”, falou. Referente a acústica do “Integração Bar”, o secretário afirmou que foi procurado pelo proprietário do estabelecimento e um engenheiro que informaram que irão apresentar projeto à prefeitura para resolver problema. “Já no Brizola, ele não tem música ao vivo tem duas caixinhas de som, mas também já foi multado nas vezes que denúncias chegaram a nós”, falou. 

Com relação a perturbação de sossego, o secretário disse ainda que o ato configura contravenção penal e que neste caso o morador deve denunciar à Polícia Militar para intervir. “Tratamos todas as situações sem favorecimento ou perseguição. Estamos agindo dentro da legalidade”, ressaltou. Ele pediu aos comerciantes que haja sempre com bom senso em relação a barulhos excessivos para não incomodar os vizinhos. 

Polícia Militar

A TRIBUNA ouviu também a Polícia Militar sobre a situação. O tenente Mendes, do 11º Batalhão de Polícia Militar de Campo Mourão,  comentou que em relação a perturbação de sossego por estabelecimentos a polícia pode agir somente com representação. Segundo o policial, muitas vezes a pessoa aciona a polícia, mas temendo possíveis represálias acabam não representando contra o estabelecimento, o que trava o processo. 

“Qualquer cidadão está apto a representar uma perturbação de sossego a qualquer hora. Pode ser 15 horas, se o som ou barulho estiver incomodando e a pessoa quiser representar ela tem o direito”, afirmou. Nestas situações, em caso de som alto, por exemplo, a aparelhagem é apreendida e o responsável pode ser penalizado com multa. “Cabe o bom senso dos proprietários de bares e dos próprios frequentadores estarem sempre se policiando para evitar barulhos excessivos para não perturbar a vizinhança”, orientou.