Ulisses: O homem da televisão

Ulisses nasceu em Aparecida da Conceição, Minas Gerais, em 1943. Veio no berço de uma família humilde, simples demais, com raízes na lavoura. Os pais tiveram 13 filhos. Tentando uma vida melhor, rumaram ao norte do Paraná, oito anos depois. Ainda criança, o menino trabalhou na roça com a família, até os seus 17. Pobre, ia a escola descalço. Não havia grana para gastar em sapatos. Mas, entre a colheita e o plantio do café, ele não sabia que o destino confiaria uma carreira entre astros e estrelas da televisão. A vida é feita de muitas surpresas. 

Aos 18, Ulisses conheceu Iolanda. Assim como ele, também era uma moça simples, do campo. Se apaixonaram, casaram e logo tiveram o primeiro filho. Preocupado com a saúde da filha, o pai de Iolanda preferiu levá-la até São Paulo. Era lá onde nasceria o primogênito. Ulisses foi dias depois. E acompanhou o parto. Desde então, a capital foi o local escolhido para viverem. Uma cidade enorme, diferente dos rincões do interior onde morou.  

Como uma espécie de Mazzaropi perdido na cidade grande, era hora de se aprumar na vida. Tinha que arrumar emprego. Então, andando pelas ruas do Sumaré, decidiu entrar num prédio imponente. Ou vai ou racha. “Falei com o porteiro se estavam precisando de alguém para trabalhar. Ele perguntou o que eu sabia fazer. Fui sincero e disse: não sei fazer nada”, lembrou. 

Era 1964. O prédio em questão era nada mais que a sede da TV Tupi. Praticamente, o berço da televisão brasileira. Apresentado ao pessoal dos recursos humanos, foi contratado para limpeza geral. Agora, com uma vassoura na mão, já podia sustentar a família. O tempo passou. E com ele, o carisma de um homem completamente vocacionado a simplicidade. E, certamente, por ser assim, conquistou o carinho de todos ali. Era considerado um gentleman. 

Acontece que abriu vaga no setor da marcenaria da tv. Ulisses foi transferido, mesmo ainda não sabendo manejar os equipamentos. Mas ele aprendeu. Começou a construir cenários aos programas da época, entre eles, o de um apresentador com “certo” futuro: Silvio Santos. Era década de 60. Para ele, tudo era novo. E, na sua inocência, já começava a ser normal transitar entre as estrelas.

Ao todo, foram 15 anos atuando somente na TV Tupi. Virou referência no desenvolvimento de cenários. Tanto é que, ao mesmo tempo, mas já no final dos anos 70, também passou a trabalhar na TV Bandeirantes. E foi lá, quando também fez cenografia ao programa de Abelardo Barbosa, o Chacrinha. “Conheci todos os artistas daquele tempo. Tenho fotos com muitos deles”, disse Ulisses.     Em 79, ao deixar a Tupi – a emissora enfrentava uma grave crise financeira, que culminou na sua falência em 80 -, Ulisses passou a trabalhar ao Grupo Silvio Santos, na época TVS. Lá, na Vila Guilherme, continuou no desenvolvimento de cenários. Ficou muito próximo de Roque, o ajudante de palco mais conhecido e antigo do apresentador. “Também era muito amigo do Assis, o cara que dobrava as notas de dinheiro em forma de aviãozinho ao Sílvio”, disse. 

Em 84, ainda na TVS, participou ativamente nas gravações da novela Jerônimo, o Herói do Sertão, protagonizada por Francisco Di Franco. Durante 30 dias, o elenco se dirigiu até Cabreúva, no interior de São Paulo, onde gravou cenas externas. “Foram 30 dias que nunca mais vou esquecer”, disse Ulisses. Lá, sua amizade com atores e atrizes se fortaleceu. Era tido como um membro da família, descreveu.

No entanto, algo tinha que dar errado, como sempre acontece na vida. Um dia, cansados das gravações, o elenco precisava dormir cedo. Foi então que Ulisses teve a ideia de fazer um chá de erva cidreira – aprendizado de suas raízes no campo. Com muito carinho, o distribuiu a todos ali. O resultado foi espetacular. E desastroso. Dormiram tanto, que acordaram com os olhos inchados. “O diretor da novela queria me matar. Os atores acordaram com olheiras gigantes, de tanto dormir. Eu entupi os caras com o chá”, lembrou ele, as gargalhadas. “A tv é uma família. Tenho muitas saudades de tudo o que ali vivi”, diz. Ulisses se emocionou ao relembrar o passado. 

Ulisses também trabalhou por dois anos na Rede Record e outros seis na TV Cultura. Mais tarde, já fora da tv, ganhou dinheiro fazendo cenários ao lançamento de automóveis. Época em que viajava todo o país por uma produtora. Conhecido no meio artístico, principalmente, por sua simplicidade e honestidade, por vezes, foi convidado a cuidar do camarim do Rei Roberto Carlos. “Eles queriam alguém de confiança para cuidar do camarim. Por algumas vezes, fui eu quem cuidei. Sou muito grato por isso”, disse. 

A vida em São Paulo terminou na década de 90. Foi quando soube da morte da mãe, que morava em Campo Mourão. Na época, já com três filhos, vendeu os imóveis, arrumou a mudança e desembarcou nas terras vermelhas do interior paranaense. Duas filhas ficaram em São Paulo. O filho mais velho, veio com o casal. 

Ulisses, 78, e a esposa, Iolanda, 76, continuam em Campo Mourão. Têm sua própria casa, um carro e vivem tranquilos com suas respectivas aposentadorias. Longe da vida corrida de São Paulo, aprenderam a viver com passos lentos. Evangélicos, os dois frequentam a Igreja Quadrangular, e continuam na simplicidade de sempre.