Finados 2020: Dia de orações, saudades e esperança, por Gilmar Cardoso

“Na mesma pedra se encontram,/Conforme o povo traduz,/Quando se nasce – uma estrela,/Quando se morre – uma cruz.Mas quantos que aqui repousam/Hão de emendar-nos assim:”Ponham-me a cruz no princípio…E a luz da estrela no fim!” (Inscrição para um portão de cemitério, de Mário Quintana).

O dia de finados, deve ser um dia de oração, de homenagem cristã aos nossos entes queridos falecidos, e, também, um dia de reflexão sobre o mistério da morte e da ressurreição que marcam nossas vidas.

Neste Dia de Finados celebre as lembranças que os que já se foram deixaram e valorize as pessoas que ainda caminham ao seu lado. Aqueles que amamos, nunca morrem. Apenas partem antes do que nós.

Cremos que Deus um dia nos colocará juntos, novamente. Por isso. O Dia de Finados é um tempo de orar, recordar e   homenagear aqueles que partiram mas permanecem nos corações e na memória dos que ficam. Que esta data traga paz para os que sofrem com o luto e acenda nos seus corações a luz da esperança.

A Igreja, após a festa litúrgica de todos os Santos, convida-nos a comemorar – isto é, a lembrar – os que nos precederam na morte não só rezando por eles, mas recordando seus exemplos, virtudes e méritos. E ao estimular-nos a rezar pelos mortos, a Igreja tem a convicção de que, como Corpo Místico que somos, como membros uns dos outros, podemos auxiliá-los a diminuir o retardo purificador em que se encontram.

Em Cristo brilhou para nós a esperança da feliz ressurreição. E, aos que a certeza da morte entristece, a promessa da imortalidade consola. Senhor, para os que creem em vós, a vida não é tirada, mas transformada. E, desfeito o nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um corpo imperecível. (Do Prefácio dos fiéis defuntos).

“Aquele que visita um túmulo apenas manifesta, por essa forma, que pensa no Espírito ausente. A visita é a representação exterior de um fato íntimo. Já dissemos que a prece é que santifica o ato da rememoração. Nada importa o lugar, desde que é feita com o coração.” (“O Livro dos Espíritos”)

Diz o Papa Francisco: “O sentimento da tristeza, o cemitério é triste, recorda os nossos entes queridos que morreram e nos recorda o futuro: a morte. Mas nesta tristeza trazemos flores como um sinal de esperança, também possa dizer de festa mais adiante… Esta tristeza se mistura com a esperança. É o que todos nós sentimos hoje nesta celebração. A recordação de nossos entes queridos e a esperança”.

 “Finados” vem do latim: “fines”, que quer dizer “limites”, “extremidades”. É pois o dia em que somos convidados para nos lembrar dos que ultrapassaram os limites da vida terrena. Partiram de nosso convívio. A Igreja desde os primórdios, faz a memória dos que foram desta vida, cuja lembrança guardamos nos escrínios das nossas saudades.

A Escritura Sagrada nos faz entender que nossos atos meritórios estão guardados nos celeiros de Deus e os nossos exemplos iluminam os que aqui ficaram à espera do chamado do autor da vida. Não sei se é também por isto que há os que acendem velas nos jazigos silenciosos dos nossos cemitérios. Não poderia este gesto ser o sinal de que as vidas destes antepassados foram exemplos de luz para os que ficaram?

No Cemitério não encontramos os que partiram, apenas lembranças com saudades do passado das pessoas que amamos. Lembramos as histórias, as lutas, as alegrias e tristezas. Mantemos e guardamos a saudade que nos faz tão bem. Somos convidados a não guardar sentimentos de tristeza, pois, ela trás dor e sofrimento. No Cemitério ou no templo, encontramo-nos conosco mesmos, com o Senhor e com o outro. E neste encontro vamos fazendo o nosso caminho. Além de rezarmos por nossos entes queridos, pelos vivos e demais necessidades é um momento propício e oportuno para avaliarmos a nossa própria vida. Estarmos atentos, vigilantes e em oração, pois não sabemos o dia e nem a hora em que o Senhor virá. “Vocês também estejam preparados, porque o Filho do Homem vai chegar na hora em que vocês menos esperam” (Lc 12,40).

Humanamente falando, não gostamos de pensar na morte, especialmente na nossa própria morte. No entanto, temos a certeza que chegará o nosso dia. Por que temos receio da morte? Porque tira do nosso convívio pessoas muito queridas por nós! Acaba com planos e sonhos! A morte nos rouba pessoas que amamos. Como é difícil lidar com este mistério. Sofremos com sua perda. Sua partida nos empobrece, deixa em nós um vazio, um oco no estômago, uma angústia incontida. Ficam a dor, a lembrança, a saudade, em difícil convivência com a certeza da ressurreição, da vitória sobre a morte e a fé na vida eterna. A morte é dura, fria e vazia, mas Cristo nos deu a mensagem de esperança. “Nela brilhou para nós a esperança da feliz ressurreição. E, aos que a certeza da morte entristece, a promessa da imortalidade consola. Para os que crêem em Cristo a vida não é tirada, mas transformada. E, desfeito o nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um corpo imperecível” (MR, prefácio f. defuntos I).

O Dia de Finados, como é conhecido, foi instituído inicialmente no século X, na abadia beneditina de Cluny, na França, pelo abade Odilo (ou Santo Odilon [962-1049], como chamado entre os católicos). Odilo de Cluny sugeriu, no dia 02 de novembro de 998, aos membros de sua abadia que, todo ano, naquele dia, dedicariam suas orações à alma daqueles que já se foram. A ação de Odilo resgatava um dos elementos principais da cosmovisão católica: a perspectiva de que boa parte das almas dos mortos está no Purgatório, passando por um processo de purificação para que possam ascender ao Paraíso.

O Dia de Finados é celebrado no dia 2 de novembro porque no dia 1º de novembro é comemorado o Dia de Todos os Santos – data que celebra todos os que morreram em estado de graça, mas que não tiveram a oportunidade de serem canonizados ou que não são lembrados em orações por ninguém. Solenidade de todos os Santos que estão com Cristo na Glória. Na mesma celebração festiva, a santa Igreja ainda peregrina sobre a terra venera a memória daqueles cuja companhia alegra os Céus, para que se estimule com o seu exemplo, se conforte com a sua proteção e com eles receba a coroa do triunfo na visão eterna da divina majestade” é o texto do Dia de Todos os Santos. “A Igreja, mãe piedosa, quer interceder diante de Deus pelas almas de todos os que nos precederam marcados com o sinal da fé e agora dormem na esperança da ressurreição, bem como por todos os defuntos desde o principio do mundo cuja fé só Deus conhece”, diz o livro, sobre o dia 2. Estes dois dias ensinam-nos o que é essencial e mais belo. Não caminhamos só para a escuridão do túmulo, mas para a luz plena de Deus.

No estado de purgação, as almas necessitam, segundo a doutrina católica, de orações dos vivos, que podem pedir para elas a misericórdia divina e a intercessão dos santos, da Virgem Maria e do principal mediador, o Deus Filho, Jesus Cristo.

A data, que simboliza a lembrança e o legado de quem já se foi, é marcada por vários rituais. Dependendo da cultura, o dia ganha um viés festivo ou torna-se um momento para reclusão e reflexão. Inclusive, alguns países juntam as celebrações do Halloween com o Dia de Finados, tornando a data uma celebração conjunta.

A vida é breve e mede-se pelo saldo de solidariedade que levamos para a eternidade. Meus queridos irmãos e irmãs, concluo com as palavras do Santo Padre, o Papa Francisco: Voltemos para casa hoje com esta recordação do passado, de nossos entes queridos que morreram, mas com um olhar para o futuro, para onde iremos, confiantes nas palavras de Jesus: “Eu o ressuscitarei no último dia”.

Não nascemos para morrer, mas morremos para nascer… para a vida eterna, na plena comunhão com Deus e com os irmãos e irmãs. Que as almas de todos os fiéis defuntos, pela infinita bondade e misericórdia de Deus, descansem para sempre na luz de Cristo!

Ó Meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno, levai as almas todas para o Céu e socorrei principalmente as que mais precisarem!
 
* GILMAR CARDOSO, advogado, poeta, membro do Centro de Letras do Paraná e da Academia Mourãoense de Letras – AML.