Denúncias indicam que Saúde de Peabiru pode estar ‘doente’

Nos últimos dias uma série de denúncias envolvendo a secretaria de Saúde de Peabiru, começaram a transparecer que algo pode não estar bem. De uma certa maneira, a Saúde lá, estaria supostamente “adoentada”. E isso é evidenciado no Ministério Público, onde 12 pessoas, a maioria servidores, começaram a ser ouvidos há uma semana. São relatos de prevaricação, ingerência, ameaças, furtos e até, privilégios.

O eixo principal das denúncias aponta um servidor contratado. Na verdade, um técnico de enfermagem. Ele estaria, pelo menos desde 2022, realizando ações criminosas na secretaria, como por exemplo, fraudando o livro ponto. De acordo com as acusações, mesmo não cumprindo a carga horária, ele o adulterava, marcando presença durante toda jornada de trabalho. A ele também recaem denúncias sobre a venda de falsos atestados médicos, se utilizando até, de carimbos de profissionais ali radicados.

“Não bastasse isso, ele ainda furtava medicamentos, soros, equipos, agulhas e outros insumos da unidade de Saúde”, afirmou um enfermeiro que preferiu não ter o nome revelado. Segundo ele, todos os maus procedimentos, testemunhados por vários outros profissionais, eram relatados num livro chamado “Ocorrências do Enfermeiro“. No entanto, misteriosamente, segundo ele, o livro desapareceu. “Ali eu escrevia que ele havia levado insumos. Que havia abandonado o plantão. Mas mesmo denunciando, nunca, nada foi feito. Nenhuma investigação foi realizada”, afirmou. A reportagem teve acesso a fotos dos relatos contidos no livro.

Há uma semana, desejando obter respostas sobre as denúncias, o repórter João Silvestrin procurou a secretária de Saúde, Valeska Alves. Ela até aceitou conversar. E o convidou a adentrar a sua sala. Mas, num comportamento ante político e até, antidemocrática, o prefeito Júlio Frare a retirou da entrevista de modo ríspido. “Ele foi muito grosseiro. Foi mal educado. E demonstrou ali que havia algo a ser escondido”, disse o repórter.

O ápice da falta de transparência aconteceu dias depois, na inauguração da nova UPA da cidade. Enquanto Silvestrin entrevistava o prefeito, adeptos de sua administração tentaram o amedrontar, chegando inclusive a empurrá-lo.

Mas, vendo que a coisa havia passado do limite, o prefeito procurou Silvestrin, o chamando para uma entrevista na manhã da última segunda-feira (26). Sobre as denúncias, Frare afirmou que irá abrir um processo administrativo, buscando saber o que houve. “Se for comprovado o teor das denúncias, o servidor irá arcar com as despesas do que furtou”, afirmou.

Questionado sobre a suposta adulteração no livro ponto, o prefeito explicou que não controla a ficha dos funcionários. “Não sei quem está trabalhando. Mas vamos apurar os fatos sobre o livro ponto. Também não sei se ele tem banco de horas para tirar”, disse. O banco de horas para tirar, a que se refere, também é um dos mistérios a serem investigados. Isso porque, no caso do técnico denunciado, sua contratação não dá o direito a férias. No entanto, ao ser perguntado, pela reportagem, onde estava, via WhatsApp, o técnico respondeu: “Estou de férias, volto em uma semana”.

A secretária de Saúde também aceitou falar sobre as denúncias. Ela confirmou que o regime de trabalho do técnico não lhe dá o direito à férias. No entanto, ele pode estar usufruindo de horas extras. Ou ainda, se utilizando de “férias”, mas a pagar com horas futuras no trabalho. “Todo mundo aqui é ser humano. A unidade trabalha 24 horas por dia. Então, quando algum deles me procura, tentamos ajudar com folgas. E fazemos para todos. Ele não é o único”, disse.

De acordo com Valeska, ela foi informada, sim, de supostas subtrações de insumos por parte do técnico. “As denúncias são graves e estamos verificando”, disse. No entanto, ela não soube informar porque não investigou antes, já que as anotações do livro de ocorrências sobre os furtos teriam sido denunciados desde 2022. “Se for provado isso, vamos adotar medidas cabíveis”, afirmou ela.

Temos que investigar. Se ele tiver culpa vamos cancelar o contrato que temos com ele. Vamos apurar com a ajuda do Ministério Público. Quanto a secretária de Saúde, ainda vamos analisar a sua demissão. Vamos estudar, se ela sabia dos fatos ou não. Temos que levantar todos os dados. Se existir culpado ele vai ser penalizado”, concluiu o prefeito.

Denúncias

As denúncias envolvendo o técnico de enfermagem indicam que ele seja um amigo pessoal da secretária de Saúde, Valeska Alves. E, por este motivo, estaria recebendo privilégios. Motivo também explicado pela ausência total de uma investigação interna, já que as acusações datam de 2022. De acordo com levantamentos, além de muitas testemunhas, existem provas das subtrações através de filmagens da unidade de saúde. “Se ninguém apagou as imagens, elas estão lá”, disse um dos denunciantes.

“Além de escrever no livro de ocorrências, ainda descrevíamos os fatos ao coordenador da UPA. Era ele quem tinha a missão de relatá-los à secretária. No mínimo, ela foi conivente com a situação”, afirmou uma das testemunhas. Segundo ele, o servidor chegava, por muitas vezes, a abandonar o plantão, o que é crime pela legislação brasileira. A reportagem entrou em contato com o coordenador, mas ele não respondeu aos questionamentos.

As denúncias indicam que o técnico levava uma mochila preta de sua casa, de tamanho médio, a qual foi apelidada de “bolsa do crime”. Ela chegava vazia. E quando saía, estava preenchida com inúmeros itens comprados com o dinheiro da população. “Ele não tinha medo e nem vergonha. Enfiava os insumos na bolsa diante das câmeras de filmagem. Outras vezes, até mesmo na frente de pacientes. Era escancarada a prática”, afirmou a testemunha. O Ministério Público está apurando todas as denúncias.

Em tempo

O técnico de enfermagem denunciado não forneceu maiores informações porque, segundo ele, estava de férias no litoral de Santa Catarina. “Quando eu voltar esclareço tudo”, disse. Ontem, no entanto, ele já estaria de volta ao trabalho. Mesmo assim, ele não retornou aos questionamentos feitos pela TRIBUNA.