Psicólogo comenta sobre o hábito de transgredir regras

O alto risco de contágio do Coronavírus exigiu que o poder público estabelecesse novas regras de convívio social. Entre elas o distanciamento entre as pessoas, uso de máscaras, higienização, novo modo de cumprimentar, entre outras. Entretanto, como acontece com as demais regras criadas para disciplinar a vida em sociedade, muitos insistem em transgredi-las, mesmo diante da possibilidade de punição. 

Sobre o assunto a reportagem da TRIBUNA ouviu o psicólogo e professor Frank Duarte. “A vida em sociedade necessita de regras. Desde os mandamentos bíblicos para nortear a vivência do povo daquela época até os decretos de hoje para disciplinar o comportamento diante de um grave risco à saúde”, pondera.

Ele explica que a personalidade define o indivíduo na sua interação com o mundo. Essa personalidade é constituída a partir da hereditariedade, condições culturais (meio em que está inserido) e a situação. “Faço doutorado na Argentina e pela cultura de lá, ao terminarem uma refeição no restaurante as pessoas retiram os restos de alimentos dos pratos da mesa e depositam no lixo. No Brasil, precisa ter regras para isso porque não temos essa cultura”, exemplifica.

Sobre a questão da saúde ele cita o exemplo da China, onde qualquer pessoa com doença contagiosa usa máscara para proteger quem convive com ela. “Aqui precisamos ter uma lei que obrigue usar máscaras e mesmo assim muitos insistem em não usar”, analisa. De modo geral, segundo ele, a regra só é necessária diante da ausência de cultura. 

Segundo ele, para que seja plenamente obedecida, a regra deve estar associada ao processo educativo. “Todo comportamento é aprendido, ninguém nasce sabendo. A criança até 5 ou 6 anos copia o que fazem os adultos com quem convive. Quando já adulto, é preciso aliar a educação com punição. No trânsito, por exemplo, mesmo aumentando o valor da multa, não reduz o número de acidentes. Isso porque o processo não envolve só punição, mas também educação”, exemplifica.

Em geral, a mudança de comportamento demanda tempo. “Há alguns anos um fumante acendia o cigarro em ambiente fechado tranquilamente. Os fumantes de hoje sentem-se inibidos e nem se atrevem fumar em determinados locais. Dizem que esse processo de assimilação de uma regra leva pelo menos três anos”, acrescenta.
 
Segundo Frank, os brasileiros também costumam adaptar-se a transgressões. “Trancamos o carro, o portão, fazemos seguro, colocamos cerca elétrica porque convencionou-se achar natural que a ocasião faz o ladrão. Na verdade a ocasião só mostra quem rouba e quem não rouba. Essa inversão de valores é nociva ao convívio social. A sensação de impunidade pode facilitar a transgressão, daí a necessidade da punição”, completa.