Pelé

“Se Pelé não tivesse nascido homem, teria nascido bola”.
Jornalista Armando Nogueira

Ele não precisa de adjetivos, qualquer qualificação o enaltece.

Se tornou e para sempre será o simplesmente, Pelé. Embora aqui grafada, a palavra “simplesmente” é, em parte, contraditória, visto que ele era singularmente genial, também era simples em muitas jogadas.

Qualquer dicionário terá a palavra Pelé. Mais do que a conceituação – aparentemente indefinível – sinônimos, significativos, muitos contextos, no sentido bem mais e maior do que a de jogador de futebol, de atleta.

Os dicionários trarão o sentido antropológico, social, histórico, filosófico, sociológico, desportivo, político, cultural e, entre outros ainda, o de brasileiro, de todos os tempos.

Antes de receber a coroa, já se tornara o Rei.

Antes de ser majestade, já tinha seus súditos, estádios repletos.

A Vila mais famosa do Mundo, a Belmiro simboliza, agora mais do que nunca, todas as vilas, desde os campinhos de terra nos terrenos baldios, dos campos de futebol bem modestos até os maiores estádios do planeta, todos os quais que seriam adjetivados como com o sobrenome “maracanã”.

O ídolo de todos os times, orgulho especial aos santistas, eles que recebem a homenagem de todos os clubes brasileiros e os do mundo todo.

Sem poder nada acrescentar sobre Pelé, para antes de transcrever o que o grande cronista esportivo disse sobre o jogador em 2010:

“Pelé já era o melhor muito antes de ser; e continua sendo, mesmo depois de ter sido”.

A seguir o texto do referido jornalista, preciso ao escrever que se o Pelé não fosse nascido homem teria nascido bola. A crônica de Armando Nogueira é de 1969, publicada no Jornal do Brasil em 21 de novembro, Coluna “Na Grande Área”:

“Um amigo me telefona, cedinho, para insistir na reação do primeiro momento: gostaria de ver Pelé fazer o milésimo gol, mas preferia que não fosse de pênalti porque, “de pênalti, não teve muita graça.

Assim também chegara a pensar o próprio Pelé, antes de ver a bola morrer (ou nascer) no fundo da rede. Tanto que ameaçou refugar, coerente com afirmações anteriores de que se lhe tocasse encerrar o balanço com gol de pênalti, passaria a bola a outro jogador.

E, no entanto, na hora de fazer o gol-símbolo de sua vida, Pelé não poderia merecer do futebol distinção maior: o estádio imenso, o silêncio musical da multidão, a corte de parceiros e rivais em torno dele, imóveis; a bola, proibida de todos, a seus pés – e uma eternidade para chutá-la, pois só aí a lei do futebol oferece o privilégio de estender indefinidamente o jogo até que se cumpra de todo o ritual do pênalti.

O gol de ação, o gol de movimento – esse, Pelé já fez 999 vezes, chutando bolas suadas, bolas sangrentas, bolas mortas, bolas vivas, divididas.

O gol dos deuses, bola no peito, três dribles verticais, um chute mortal – Pelé já fez tantos.

O gol dos meninos, quantos Pelé já não fez? driblando defesas inteiras?

O gol dos espertos? Pelé já fez: um dia, num córner, enlaçou o braço no braço de um beque e gritou em desespero: “Está me agarrando!” O árbitro marcou pênalti, Pelé chutou e fez o gol.

O gol dos sonsos, Pelé também já fez, capengando, de mentira, na meia-lua, e logo surgindo na pequena área, encontro marcado com a bola, antes do córner, antes do jogo, muito antes de tudo e de todos.

Faltava-lhe, porém, fazer o gol feito, que é o gol da multidão, o gol de todos os testemunhos, o gol que ninguém no estádio, por descuido ou infortúnio, deixasse de ver, florescendo de seus pés, como já disse, tão amados.

Era preciso, sim, o cerimonial de um pênalti para nos compensar de tantos gols bonitos que ele fez nesse milhar e que nos escaparam na vertigem da ação coletiva.

Abençoado é o pênalti que não castiga, mas gratifica: quando Pelé, no fundo da rede, beijou mil vezes a bola do seu gol-símbolo, o estádio viveu um instante de libertação – e Pelé, mais um de consagração. Éramos, ali, uma doce multidão de crianças, reencontrando a bola da nossa infância.

Nunca, que eu saiba, a multidão participou tanto de um gol, pesadelo e sonho de Pelé – e de todos nós.

Fiquemos, pois, com a graça de uma noite de reencontro.

Que dele seja a bola que renasceu com ele, no instante de um gol-sacramentado.”

Fases de Fazer Frases

O sobrenatural é para gênios, sobre o natural.

Olhos Vistos do Cotidiano
Poucas vezes sobre o Brasil, um fato repercutiu em todo mundo e no mundo todo: Pelé sempre foi o ser mais conhecido em todo o planeta.

Farpas e Ferpas
Nada é mais do que nada mais.

Reminiscências em Preto e Branco
Tempo não é um só tempo. É tempo de tempos em tempos.

José Eugênio Maciel | [email protected]